sexta-feira, dezembro 23, 2011

Pára, escuta e olha...



... é Natal e somos privilegiados, todos.

(Uma cópia descarada de um trecho de um dos meus livros preferidos citado, recentemente, pelo Fernando Alves)


Entre uma infinidade de hipóteses de não teres nascido, saiu-te a sorte de teres nascido. Se te tivesse saído a "sorte grande", haveria gente que se admiraria de isso te ter acontecido. Tu mesmo dirias talvez que parecia um "sonho", que era inacreditável, que ainda não tinhas caído em ti do assombro. Mas essa sorte foi a de um número entre dezenas de milhares ou mesmo centenas. Mas teres nascido é ter-te saído a sorte entre biliões e biliões e biliões de hipóteses negativas. Saiu-te o número inscrito numa areia do universo. Tens pois o privilégio incrível de veres o sol, as flores, os animais. De ouvires as aves e o vento. De. E todavia, como esqueces isso tão facilmente. Breve tudo se apagará em silêncio. Breve a oportunidade de estares vivo cessou. Provavelmente ninguém mais saberá que exististe. E mesmo dos que o souberem, não se saberá um dia. Num momento não muito longínquo morrerá o último homem sobre a face da Terra. Esse é, aliás, o momento da tua própria morte, porque tu és o primeiro e o último homem que nasceu. Tudo é rápido e contingente e miraculoso. Tudo é rápido e sem consequências. A única consequência és tu e a vida que viveres. Não a desperdices. Não inutilizes a fabulosa sorte que te calhou. Vê. Ouve. Pára, escuta e olha, que a morte vai a passar. E terás cumprido ao menos, para com o universo, um pouco do teu dever de gratidão.



Vergilio Ferreira, Pensar (ponto 178)

segunda-feira, dezembro 19, 2011

cats and dogs

Christopher Hitchens (1949-2011) e a sua avassaladora lucidez.

Frequentemente

(numa esquina, perto da Avenida da Liberdade)



Nas minhas deambulações pedestres por Lisboa tropeço (por vezes literalmente) em tudo. Em alegrias e tristezas, amores e desamores, enfados e euforias. Ultimamente tropeço frequentemente em utopias.

quarta-feira, dezembro 14, 2011

A mudança mais desejada

Hoje, também os carros dançam. As casas movem-se levemente. E eu – que mudei de casa e de roupa, de cidade e de cama, de palavras... Eu, que mudei de música e de carro, de saudade, de quarto... Eu – que mudei de computador e de rua, de eternidade e de paisagem, de abraço e de clima... Eu – que mudei de língua e de lágrimas, de deus e de caderno, de crenças e de céu... Eu – que mudei de lume, que mudei de medos... Eu – que mudei de planos, de lençóis, de secretária... Eu – que mudei de óculos e de rumo, de amigos, de champô, de rituais e de supermercado... Eu – que mudei de tudo que em quase nada mudou, mudei de dentro de mim para dentro de ti, meu amor.



Filipa Leal
in Talvez os Lírios Compreendam, 2004

um mês, uma página vazia e um final feliz



Um Dezembro boquiaberta. Inundada de queixumes egoístas e vidas vazias, inúteis porque o sentido perdeu-se em sonhos fúteis. Um Dezembro de compras, de trânsito, de compulsão. Um Dezembro de panfletos egoístas distribuídos a cada esquina. Em fundo, quase em surdina, algum americano, muito famoso, canta uma música natalícia. Um mês de partidas esperançosas e de chegadas previstas, de encontros oficiais e de desencontros oficiosos. Um Dezembro que me petrifica na presença de uma página em branco, a angústia da escolha da primeira palavra para uma nova, longa e atribulada história à qual não posso negar um final feliz.

quarta-feira, novembro 30, 2011

Passado presente



Tenho acordado com o passado. Parte de mim ficou por lá, ora arrumada com método, ora distraidamente espalhada no chão. Aprendi a dar-lhe a importância devida, uma década de desintoxicação do passado, medicada com sucesso por doses regulares de presente e sobredosagem de esperança no futuro. Mas tenho acordado com o meu passado depois de noites longas e tranquilas. Não o carrego pesarosamente ou me iludo com as suas glórias. Acordo com ele simplesmente. Saímos de casa cedinho no meio do nevoeiro, ouvimos o dueto Caetano-Gadú durante todos os percursos de solidão. É uma espécie de amigo imaginário, este passado, que agora me acompanha, tranquiliza e sussurra qualquer coisa que ainda não consigo entender, embora suspeite ser da máxima importância.

Pecado




Um ministro muito opinador, a propósito de convulsões orçamentais, invocava em vão o santo nome da Serenidade. Contei, cinco vezes em meio minuto. Serenidade para agir, pensar, dialogar, decidir, Serenidade para aceitarmos. Até um ateu teria visto ali um pecado mortal com direito a uma eternidade ardendo nas chamas do Inferno.

sexta-feira, novembro 25, 2011

Carta de Condução

Carta de condução

Já tive um carro da cor dos teus olhos. Deixava-o
estacionado à frente de prostíbulos onde alugava
quartos com vista sobre o quintal dos vizinhos.

Esperava por semáforos, sem saber que esperava
apenas por ti. No auto-rádio, a tua voz cantava
fado demasiado velho até para a minha mãe.

A segunda circular era uma manifestação pacífica
de pára-brisas, as palavras de ordem eram simples
porque ainda não sabia que já me tinhas escolhido.

Quando os outros rapazes folheavam revistas de
carros nas aulas de matemática, eu apenas me
interessava por unicórnios e farmácias abandonadas.

Agora, os meus olhos contam quilómetros nos teus,
procuro papéis entre os papéis do guarda-luvas e
tenho tanto medo que me vendas em segunda mão.



José Luis Peixoto, in Gaveta de Papéis

quarta-feira, novembro 23, 2011

Não foram detectadas marcas de travagem





Éramos amigos há tantos anos. Talvez tenhamos nascido amigos mas toda essa eternidade não nos impediu de acelerar. Sei que conduzíamos já noite numa auto-estrada vazia, certos de que toda aquela velocidade era o nosso segredo mais profundo, via única libertadora de pequenas frustrações quotidianas. Esquecemos tudo, enchemo-nos de nós e, condutores inexperientes, acelerámos. O ego estrangulado pela insegurança e as condições de visibilidade deficientes não ajudaram. Chocámos com involuntária frontalidade. Não foram detectadas marcas de travagem no asfalto. Um de nós entrara em contramão naquela auto-estrada. Infelizmente só sobrou essa inútil discussão.

segunda-feira, novembro 21, 2011

poderes extraordinários





Ouvi várias vezes que palavras lidas não servem de nada, são refúgios, vazios e desculpas para preencherem ineficácias, são inutilidades, excessos, tiques de intelectualidade, ímanes de bocejos. Ler muito não havia ou haverá de fazer grande bem, sobretudo se o considerarmos oposto de “viver a vida”. Ler assim, dizem, condena a desaires recorrentes, escolhas erradas, rótulos inaceitáveis, absentismo de afectos, ausência de sociabilidade. A mim, que pouco mais sei da vida do que o que os livros me vão ensinando, cabe comunicar que, além de praticamente ausência de dioptrias até aos 36, eles deixam-me que construa divertidos puzzles de ficção e de realidade, dão-me que pensar e outros poderes extraordinários - desconhecidos do empirismo fundamentalista do século XXI - que serão, a seu tempo, revelados à Humanidade.

sexta-feira, novembro 11, 2011

Oh pá!

Ouve, Otelo, pá:

"O nosso quartel general é a Constituição sobre a qual os presidentes colocam a mão em juramento. O povo, Otelo, pá, é civil. Mesmo fardado."

Vã esperança



Na paragem de autocarro conversavam os três animadamente. Adolescentes, gorro até ao queixo, calças até ao sub solo e muitos "tipo", "iá" e "tás a ver". Ouvindo com mais atenção apercebi-me que um contava a conversa recente que tinha tido com o pai, que o pressionara para uma opção. Ele dissera que não sabia, que "tipo", quer aprender, sim, mas tudo, todas as coisas, o máximo que puder. O pai não compreendia, insistiu que o filho tinha se ser alguma coisa e ele, incompreendido, explicava aos amigos que para ser isso tinha de aprender muitas coisas sobre tudo. Apesar do meu coração de 160g (ecocardiograma dixit) ter ficado cheio de esperança, constatei que este país não é para Homens do Renascimento.

quinta-feira, novembro 03, 2011

Qual é o lado mais cómico disto?



Percorremos os sites favoritos num momento de inércia laboral e encontramos raios de sol como este. Não resisti, por visceral identificação, a transcrever.



"Uma das primeiras grandes revelações da minha infância, ao surpreender as coisas, foi verificar que me interrogava, invariavelmente, assim: qual é o lado mais cómico disto? Os desfiles militares, as cerimónias religiosas, os cumprimentos obsequiosos e constrangedores, os adereços excessivos da autoridade, as exigências rígidas da hierarquia, os compromissos artificiosos. E eu: qual é o lado mais cómico disto? Daí a fazer essa pergunta interior em qualquer situação dramática, foi um passo. A doença, a brutalidade, a estupidez, a intolerância, a maldade pura, a alucinação despótica – até o leito do sofrimento, o leito da morte. E eu: qual é o lado mais cómico disto?
Andava nessa altura a rir-me muito com as caras burlescas do cinema, não sabia que Shakespeare e Bergman existiam, ainda não tinha lido alguns livros trágicos e patéticos – e se soubesse que devia ter a faculdade de me rir de mim próprio, sabia-o sem o saber. Quando uma vez caí, a patinar no passeio com botas cardadas, e parti o dente da frente, fiz a pergunta calada e sacramental, enquanto as pessoas olhavam para mim: – Qual é o lado mais cómico disto?Quando a infância começou a ser perturbada por desentendimentos mais amplos com o real, insisti na defesa da minha alegria, do meu prazer de viver. E até na dor que retirava dos que amava (dos meus avós, das minhas velhas tias, por exemplo), e até na mor-te, que sempre me surpreendia, protegia-me com essa frase defensiva, essa armadura de sol, de chuva e de subir a escada a quatro e quatro.Creio que os cómicos do cinema me compreendiam melhor do que ninguém. Habitavam o coração do desastre com a desenvoltura, o corpo de borracha e a paciência evangélica dos grandes missionários da naturalidade."



Dinis Machado, Reduto Quase Final

sexta-feira, outubro 28, 2011

Sossego em fim de semana maior


Que mais quer quem descansa
- Sossego, só sossego -
Da dor e da esperança.


Fernando Pessoa, excerto do poema Aqui onde se espera

quarta-feira, outubro 26, 2011

Pensamento com asas



Ando a ler uma coisa que se chama "Justiça, fazemos o que devemos?". Esta interrogação não é nem uma chatice nem um livro de auto ajuda. É uma maneira criativa de nos ensinar filosofia politica sem adormecermos antes que a primeira linha termine.

Hoje em dia pensar é tão mau como ter peste na Idade Média, e um intelectual assumido é logo excluido de qualquer grupo social que não seja assim classificado. O casamento entre intelectuais deixará, em breve, de ser permitido e os seus outros direitos (ler um livro em sossego, ver um filme decente, ouvir um bom noticiário de fio a pavio, dizer o que pensa, pagar justamente os seus impostos, etc) andam a ser beliscados, ainda que com a subtileza que não é reconhecida à classe politica.

Não há nada mais frustrante que, perantes casos reais, pensar na solução mais justa. Quando parece que acertámos percebemos, logo de seguida, que não foi bem isso que aconteceu. Nada suporta essa ideia pura de Justiça: a nossa educação e a sua formatação ao tempo, ao lugar e à condição social, as tiranias dos escritos sagrados de várias religiões, o egoísmo e a sede de desresponsabilização.

Assumir em pleno toda a condição humana é uma inevitabilidade mas não é uma desculpa para nada. Entretanto vou olhando o espelho de esguelha na esperança que, um destes dias, me cresçam umas asas e tudo fique muito mais fácil.

domingo, outubro 23, 2011

Bernardo





Bernardo é quase árvore.

Silêncio dele é tão alto que os passarinhos ouvem

de longe.

E vêm pousar em meu ombro.

Seu olho renova as tardes.

Guarda num velho baú seus instrumentos de

trabalho:

1 abridor de amanhecer

1 prego de farfalha

1 encolhedor de rios - e

1 esticador de horizontes.

(...)

Bernardo desregula a natureza:

Seu olho aumenta o poente.(...)



Manoel de Barros, O Livro das Ignorãças

O Segredo dos Seus Olhos



Recebeu, em 2010, o Óscar para melhor filme estrangeiro. Descobri-o este fim de semana. Dizem que é um thriller hispano-argentino, encerram-no na categoria do drama. Mas eu sei também que os olhos dizem coisas incriveis que nem sempre descodificamos, e todo o drama reside aí, o thriller e a escrita são só a muleta para entender. Aqui vejo Esposito numa luta dura entre o medo e o amor e, por fim, num reencontro corajoso com o que dizem os seus olhos.

quinta-feira, outubro 20, 2011

Mahjong



Amo a ideia do mahjong: encontrar idêntico e sair da confusão, harmoniosa e repetidamente, até ao último par perfeito.

Reajuste


Sei que já nasci velha. Todos os meus desaires são tentativas inúteis de me encaixar na formal juventude. À medida que o tempo passa sinto que o reajusto cá dentro: não renego a jardinagem, a poltrona, a manta tricotada, o silêncio absoluto, as intuições absurdas, a soneca a meio da tarde, a vontande de aprender ensinando, a dor no joelho.

terça-feira, outubro 04, 2011

E se...


... Um Dia fosse um bocadinho mais que um filme de amor para um domingo de tarde ? Há dias assim: férias, praia amena neste norte que se esqueceu do Outono, uma sala de cinema só para nós, algumas palavras esquecidas que podem mudar a nossa vida.

sábado, outubro 01, 2011

Heaven, I'm in heaven

No paraíso até (quase) ao fim do mês. Até já

Antes de mergulhar nas férias...



... esta semana fui ver:

"O que diz o outro" - um imenso sketch com alguma piada sobre as conversas idiotas entre colegas de trabalho. Miguel Guilherme e Bruno Nogueira têm o toque de Midas de bilheteira mas depois de filtrar o riso, guardar umas piadas e um apontamento mímico, adorar todos os pormenores da cenografia, parece-me que a minha memória desta peça será efémera;

"Meia Noite em Paris" - Lindo, lindo lindo! Um jovem Woody perdido entre o Séc. XXI, a Belle Époque, os anos 20, uma noiva egocêntrica e a sua hesitação e insatisfação. Descobrir coisas simples de forma complicada é, para mim, totalmente familiar... embora talvez custe um bocadinho menos se for em Paris.

Para guardar

Bienal de Cerveira, Setembro 2011

terça-feira, setembro 27, 2011

Inspiração



Uma animada ida ao CBB e uma espantosa exposição do Vik Muniz: arte contemporânea para todos!

sexta-feira, setembro 16, 2011

Rentrée



Já vivem cá em casa, numa gavetinha mágica, os bilhetes para:



É como diz o outro - no Casino de Lisboa

As lágrimas amargas de Petra Von Kant - Teatro Nacional D. Maria II

Quem tem medo de Virginia Woolf? - Teatro Nacional D. Maria II



E depois não digam que não avisei.

Porque a minha vida dava um post-it...

... suspeito que a vossa também!

quinta-feira, setembro 15, 2011

De viagem

Depois de tantos meses trancada em casa estou outra vez livre, ou seja, de viagem.

"I haven’t been everywhere, but it’s on my list."

Susan Sontag

sexta-feira, setembro 09, 2011

animação fashion




Depois de jantar com um amigo numa esplanada da Av. da Liberdade, fui enredada no meio da Vogue Fashion's Night Out, um evento que se traduz na abertura fora de horas das lojas mais ou menos in de Lisboa projectando, para o exterior, a intrinsecamente inaudível dance music acompanhando tudo com as clássicas mulheres semi-nuas bamboleantes, uma pitada de red carpet e bebidas à borla e de má qualidade. Depois os (magotes de) transeuntes: os surpreendidos, os curiosos, os fashion addicted, os turistas, os alcoolicos que ingerem compulsivamente cocktails e aqueles que acham que é boa altura para expor o vestido usado no casamento do familiar emigrante no passado Agosto. Crise vê-se nos sacos luxuosos gigantes que se passeavam com brindes e compras: porta-chaves, t-shirts, peúgas e, o delírio, um cinto muito fininho com um logótipo da marca muito grande.
Resumindo: Lisboa está ainda em muito boa idade para entrar nestes delírios, mas, estou certa, o tempo não perdoa e hoje a ressaca é brutal.

domingo, setembro 04, 2011

é simples



"Porque a gente dobra a dor debaixo do braço como o jornal da tarde."


Margarida Carpinteiro,

ninguém morre de véspera, ed. rolim, 1985

sexta-feira, setembro 02, 2011

citação não sei de quem, lida não sei onde

Não importa o que fizeram contigo mas o que tu fizeste com o que fizeram contigo.

quarta-feira, agosto 31, 2011

A paciência que sou



(...)

Minha luz dos olhos que eu vi nascer

Num dia tao breve a clarear

As águas do rio são de correr

Cada vez mais perto sem parar

Sou como o morcego vejo sem ver

Sou como o sossego sei esperar.



Zeca Afonso, Canção da Paciência

terça-feira, agosto 30, 2011

Inesquecivel



No dia em que resolvi partir ouvi-a em todos os lugares por onde passei. Na terra molhada da infância, na longa estrada que percorremos algumas férias, no riso radioso quando o (re)conheceste nos meus braços, na discussão que nos trouxe a mais cómica das rouquidões. Um uníssono que me lembrava a única coisa que tive a certeza durante toda a vida: a minha memória de ti é imortal.

Lisboa à vista

Há dias que desperto para Lisboa e ela presenteia-me com ternura, com alegria, com estupefacção (e até mesmo com algum horror). Ontem começou logo pela manhã. Uma lição de ecologia. Montada no híbrido mais mais do mercado, obedecendo a um demorado sinal vermelho, falava alegremente em alta voz enquanto bebia um iogurte líquido e fumava (três coisas, ao mesmo tempo, sim). Arrancou suavemente, não sem antes atirar a beata seguida da embalagem de iogurte pela janela. De regresso a casa, noto uma mulher jovem um pouco adiante no passeio, empurrando um carrinho de bebé e enquanto falava de forma entusiasta com uma outra que a acompanhava. Reparo que lhe faltava pano nas costas da camisola, no seu lugar estavam, lado a lado, em leque, tatuados três bebés com um ar amoroso. No topo de cada um, também tatuada, uma fita ao vento com os respectivos nomes: Cristiana, Fabiana e Venusiana.

terça-feira, agosto 16, 2011

dormir

E depois de tudo, cansada, esgotada, há uma cama na minha vida que me espera pacientemente em casa. Bons sonhos!

quarta-feira, agosto 10, 2011

Não percebi

Num almoço animado brincavam com a definição de tipo de cada um e de como isso tinha mudado (ou não, em casos de teimosia radical) desde que se lembravam do que é estar apaixonado. Chegou a minha vez de brilhar sob os holofotes. E tu, qual é afinal o teu tipo? Respondi - porque depois de procurar bonito, espantoso, inteligente, criativo, charmoso cheguei a um adjectivo-chave - bondoso. Gargalhada geral. Definitivamente não percebo algumas das (minhas) piadas.

domingo, agosto 07, 2011

às voltas...


... na minha cabeça nos últimos dias.

sábado, agosto 06, 2011

A consistência da utopia




"Acresce que uma ideia inovadora é sempre utópica antes de se transformar em realidade. Finalmente, porque muitos dos nossos sonhos foram reduzidos ao que existe e o que existe é muitas vezes um pesadelo, ser utópico é a maneira mais consistente de ser realista no início do século XXI."






Boaventura Sousa Santos in "Portugal: Ensaio contra a autoflagelação"Almedina, 2011

quinta-feira, agosto 04, 2011

Diagnostic: too much Oprah



Forgiveness is giving up the hope that the past could've been any different.

sábado, julho 30, 2011

Cachorro



" O mais nobre de todos os cachorros é o cachorro quente: ele alimenta a mão que o morde".


Laurence Johnston Peter (hoje, na Única - Expresso).

terça-feira, julho 26, 2011

é este o ano




Para quem gosta, simultaneamente, de


  • arte contemporânea

  • vinho verde de qualidade

  • longos banhos de rio

  • adormecer debaixo de um salgueiro

  • descobrir novas constelações

têm MESMO de ir aqui

segunda-feira, julho 25, 2011

Incerteza

Presa em casa num fim de semana trágico, oiço a Amy cantar will you still love me tomorrow e temo pela incerteza, um dos meus maiores medos, um dos meus maiores estimulos.

sexta-feira, julho 22, 2011

em saldo

Tenho ido aos saldos numas quantas horas de almoço em tentativas sucessivas de fazer uns milagres sazonais. Procuro a intemporalidade e talvez uma gabardine a, pelo menos, metade do preço. Encontro flores, folhos, tacões, lantejoulas, números improváveis e cores indescritíveis que florescem em qualquer armário. Encontro amigas tagarelas, homens semeados às portas das lojas e, apáticos, abandonados em cadeiras e sofás, encontro crianças há muito adormecidas sobre rodas. Encontro o que não procuro, ganho fôlego e paciência, e regresso para uma nova tentativa, quiçá, ainda hoje.

um amor

Valter Hugo Mãe confessava ontem à Judite de Sousa, numa entrevista a propósito do sucesso na Festa Literária de Paraty , que ansiava ser pai porque guardava um tipo de amor específico, forte, incondicional que só poderia ser activado se tal acontecesse. Um amor inaproveitado que preenche, ali dentro, um enorme vazio.

quinta-feira, julho 21, 2011

Who gives a damn? Everybody!




"O rating é uma opinião sobre a capacidade e vontade de uma entidade vir a cumprir de forma atempada e na íntegra determinadas responsabilidades". Rating fazemos nós todos os dias quando julgamos, quando opinamos, quando supomos sobre dados que cremos indesmentivelmente objectivos. As agências de rating dos amigos, dos colegas de trabalho, dos esposos desconfiados, dos vizinhos atentos à vida da rua. Se todos os portugueses opinassem sobre Portugal, seríamos há muito lixo só que não reciclável e profundamente tóxico. Incinerados em Souselas daríamos, pelo menos, um contributo significativo para o buraco do ozono.

quarta-feira, julho 20, 2011

Gump forever

Descobri Forrest Gump. Tropeçei nele ontem, numa Fox qualquer, mesmo no início. Em 1994 achei que tinha coisas mais importantes que fazer que desperdiçar duas horas a ver o Tom Hanks. Enganei-me. Se há alguém que ainda não viu, não se arme em parvo e não espere outros vinte anos.



"Lieutenant Daniel Taylor: Have you found Jesus yet, Gump?

Forrest Gump: I didn't know I was supposed to be looking for him, sir."


"Forrest Gump: My momma always said, "Life was like a box of chocolates. You never know what you're gonna get."

quinta-feira, julho 14, 2011

ADN

Há uns anos descobri que era crescida quando num aniversário infantil, no princípio de uma história que ia contar à pequenada, me perguntaram de quem eu era mãe. Não exerci qualquer admoestação sobre o pequenote mas tenho a certeza que a história saiu menos inspirada. Recentemente convivo mais com uns primos juniores, um mini grupo dinâmico e divertido entre os 2 e os 4 anos. Depressa percebi que me tomam como igual, diluem, como eu, as grandes barreiras cronológicas e não estranham esta Gulliver que os faz rir. Temo que quando crescerem alguém lhes perguntará, nas mesmas circunstâncias, de quem são mães e pais. Adivinha-se indignação, prova de que o ADN não engana.

sexta-feira, julho 08, 2011

Encontramo-nos lá

Encontramo-nos nos funerais. Reconhecemo-nos. Desconhecemo-nos, espantamos, morremos de amor ou de inveja. Rimos perdidos na escuridão daquele humor. Choramos por todos os motivos que já até tínhamos esquecido. Nos funerais fingimos, estar tristes, estar indiferentes, fingimos rezar, penamos por ali estar. Fingimos que a dor tem cor e que apaga todo o cortejo de más memórias. Nos funerais a alma encomendada sussurra fé e medo aos nossos, irremediavelmente egocêntricos, ouvidos. Nos funerais entristecemos, comemoramos, morremos e renascemos. Encontramo-nos também ali, nos funerais.

terça-feira, junho 28, 2011

fim de ciclo

O fim de ciclo deixa nas minhas mãos recordações que ora se acentuam ora se desvanecem numa ampulheta entupida com os nossos grãos. Confusa, ansiosa, triste, deito-me na relva fresca e tento acompanhar as nuvens que passam apressadas. (Re)memorizo a minha agenda dos próximos dias, prazos, aniversários, reuniões, idas e voltas, respostas. Tudo cancelado. Oiço o 112 ao fundo, aproximando-se apressado da nossa vida, da tua morte. O telefone toca, agora não posso atender, estou naquele barco à vela a caminho da tua foz. Este fim de ciclo é ruidoso e perseverante, contraria-me. Abro o portão, corro escada acima, conduzo, autómata, guiada pelo teu olhar que insiste em não me reconhecer. Entretanto, cá dentro, adormeci, profundamente cansada, sob o sol morno de fim de tarde.

terça-feira, junho 21, 2011

Coerência e reconhecimneto

Era uma vez um casal israelita que se conheceu via facebook. O amor frutificou, casaram e tiveram uma filha. Que nome querem colocar à criança? É evidente meus caros: Like.


(história verídica contada hoje no Jornal I).

sábado, junho 18, 2011

quotidiano e sonhos simples (ainda) de criança

quando for grande

quando for grande
quero uma mão
que tenha a forma
do coração.

quando for grande
quero uma ponte
que chegue à linha
do horizonte.

quando for grande
quero um olhar
que chegue ao fundo
de céu e mar.


josé fanha

sexta-feira, junho 10, 2011

Imagine

Imagine que é eleito democraticamente deputado para o Parlamento Europeu. Voa para Bruxelas e vai comer nos melhores restaurantes, passar os fins de tarde nas melhores lojas e voar, nos tempos livres, para os melhores destinos. Claro que, no meio de tudo isto, tem tempo para cumprir o seu dever, propor umas coisas, contestar outras, indignar-se frequentemente. Agora imagine um deputado que talvez até faça tudo isto com um bocadinho menos de frequência, mas que põe, todos os meses, 1500€ de lado para atribuir bolsas a projectos de investigação. Imagine se todos os deputados fizessem algo semelhante, se todos se indignassem um bocadinho menos e praticassem um bocadinho mais... imagine.

quarta-feira, junho 08, 2011

Zapping de vida

Ontem, descansando um pouco nesta época em que sinto que não tenho mesmo mãos a medir, fiz um zapping mais demorado por quase todos os canais. Parei numa entrevista com a Ingrid Betancourt que contava, em versão compacta e retocada, a sua experiência de prisioneira na selva, sob o gume das FARC. Ela chegou a um desespero tal que se perguntou afinal que pessoa queria ser. Definiu-a, sem grandes ambições, e transformou-se nessa mesma pessoa que sempre estivera ali dentro, sobreviveu-se. Esqueçamos assim os modelos, as pressões sociais, os equívocos. Devemos ser quem queremos, deixar que essa ambição se torne rotina, que essa rotina, por fim, seja cada um de nós.

segunda-feira, junho 06, 2011

Ressaca eleitoral

Ontem fiquei sentada no sofá, palavras em directo atrás de palavras em directo, cores que se diluem, pessoas eufóricas e adormecidas, ecos que soam melhor que os discursos.
Portugal tem dificuldade em apaixonar-se. Saltamos de relação em relação numa estratégia insana de fuga para a frente. O argumento para mudar é irrepreensível: já não aguentamos mais. Não amamos o futuro mas odiamos o passado. Fecham-se ciclos por fastio, ligeira desilusão, por irresponsabilidade viciante. Desiste-se do Norte de África porque já não está a dar, atravessamos todos os oceanos primeiros cheios de esperança, de regresso mergulhados em tédio. Os franceses vinham por aí, Portugal já não estava a dar, buscámos o Brasil e depois voltámos, enjoados de tropicalidade. Aguentámos guerras e ditaduras, deixando que o tempo decida por nós. Casamos por conveniência e escrevemos poesia sobre essa infinita tristeza que nos dá o conformismo. Há muito que não ouvimos bater o nosso coração. Talvez o tenhamos deixado pendurado na ponta das armas junto com os cravos vermelhos, talvez abandonado num porão de uma nau afundada pela ganância.

Portugal tem dificuldade em apaixonar-se, cai institivamente nos braços ténues da sua própria esperança, cheio de azedume. Talvez Portugal, cansado, faça tudo para não ter de suportar a solidão.