segunda-feira, dezembro 31, 2012

Um 2013 cheio de possibilidades...

 
... é o meu maior desejo para mim, para todos.
 
Possibilidades
 
Prefiro o cinema.
Prefiro os gatos.
Prefiro os carvalhos sobre o Warta.
Prefiro Dickens a Dostoievski.
Prefiro-me a gostar das pessoas
que a amar a humanidade.
Prefiro para uma emergência ter agulha e linhas.
Prefiro a cor verde.
Prefiro não afirmar
que a razão é a culpada de tudo.
Prefiro as excepções.
Prefiro sair mais cedo.
Prefiro falar de outras coisas com os médicos.
Prefiro as velhas ilustrações listradas.
Prefiro o ridículo de escrever poemas
ao ridículo de não os escrever.
Prefiro no amor os pequenos aniversários
para festejar todos os dias.
Prefiro os moralistas que nada me prometem.
Prefiro uma bondade algo prudente
a outra confiante em demasia.
Prefiro a terra à civil.
Prefiro os países conquistados
aos conquistadores.
Prefiro guardar as minhas reservas.
Prefiro o inferno do caos ao inferno da ordem.
Prefiro as fábulas de Grimm às primeiras páginas dos jornais.
Prefiro folhas sem flores às flores sem folhas.
Prefiro os cães sem a cauda cortada.
Prefiro os olhos claros porque os tenho escuros.
Prefiro gavetas.
Prefiro muitas coisas que não menciono aqui
a outras também aqui não mencionadas.
Prefiro os zeros soltos
aos dispostos em fila para o número.
Prefiro o tempo de insectos ao de estrelas.
Prefiro fazer figas.
Prefiro não perguntar se ainda demora e quando é.
Prefiro tomar em consideração a própria possibilidade
de ter a existência o seu sentido.

Wislawa Szymborska

quarta-feira, dezembro 26, 2012

O Natal às vezes atrasa-se um pouco

João Vaz de Carvalho
 
Minha avó e minha mãe
perdi-as de vista num grande armazém
a fazer compras de Natal
hoje trabalho eu mesma para o armazém
que por sua vez tem tomado conta de mim
uma avó e uma mãe foram-me
entretanto devolvidas
não eram bem as minhas
ficámos porém umas com as outras
para não arranjar complicações.
 
Adília Lopes

segunda-feira, dezembro 17, 2012

Um nexo enchendo o vazio


Alguém que julgou que era para si em particular. Para encontrar nexo, para aceitar, para moldar estas horas sem deixar arestas, é preciso uma canção, são necessárias muitas, muitas canções que habitem vazios dentro do nosso quotidiano. Uma canção sem início e sem fim, ecoando entre a chuva, arrombando janelas fechadas, fluindo livre nas ramificações dos nossos pequenos dramas.

sexta-feira, dezembro 14, 2012

Um nome


"Conheces o nome que te deram
Não conheces o nome que tens".

Livro da Evidências

Citação inicial de "Todos os Nomes" de José Saramago

quinta-feira, dezembro 13, 2012

Essência


Marry, and you will regret it; don’t marry, you will also regret it; marry or don’t marry, you will regret it either way. Laugh at the world’s foolishness, you will regret it; weep over it, you will regret that too; laugh at the world’s foolishness or weep over it , you will regret it either way; laugh at the world’s foolishness or weep over it, you will regret both. Believe a woman, you will regret it; believe her not, you will also regret it; believe a woman or believe her not, you will regret it either way; believing a woman or not believing her, you will regret it both ways. Hang yourself, you will regret it; do not hang yourself, and you will regret that too; hang yourself or don’t hang yourself, you’ll regret it either way; whether you hang yourself or do not hang yourself, you will regret both. This, gentlemen, is the essence of all philosophy.
Kierkegaard

quarta-feira, dezembro 12, 2012

Efeito globalização


Papai Noel às Avessas

Papai Noel entrou pela porta dos fundos
(no Brasil as chaminés não são praticáveis),
entrou cauteloso que nem marido depois da farra.
Tateando na escuridão torceu o comutador
e a eletricidade bateu nas coisas resignadas,
coisas que continuavam coisas no mistério do Natal.
Papai Noel explorou a cozinha com olhos espertos,
achou um queijo e comeu.

Depois tirou do bolso um cigarro que não quis acender.
Teve medo talvez de pegar fogo nas barbas postiças
(no Brasil os Papai-Noéis são todos de cara raspada)
e avançou pelo corredor branco de luar.
Aquele quarto é o das crianças
Papai entrou compenetrado.

Os meninos dormiam sonhando outros natais muito mais lindos
mas os sapatos deles estavam cheinhos de brinquedos
soldados mulheres elefantes navios
e um presidente de república de celulóide.

Papai Noel agachou-se e recolheu aquilo tudo
no interminável lenço vermelho de alcobaça.
Fez a trouxa e deu o nó, mas apertou tanto
que lá dentro mulheres elefantes soldados presidente brigavam por causa do aperto.

Os pequenos continuavam dormindo.
Longe um galo comunicou o nascimento de Cristo.
Papai Noel voltou de manso para a cozinha,
apagou a luz, saiu pela porta dos fundos.

Na horta, o luar de Natal abençoava os legumes.

Carlos Drummond de Andrade




sexta-feira, dezembro 07, 2012

Está oficialmente aberta a época natalícia

Um sopro


"Eu olho para trás, não sou como os outros que dizem que fariam tudo igual, eu faria muita coisa diferente. A vida é difícil, a vida nos leva a coisas que às vezes a gente não quer. A vida é um sopro, a gente vem, conta uma história e todo o mundo esquece depois. (...) Cem anos não dá prazer. Eu ia passar os cem anos sem muita alegria. A vida passou, eu procurei ser correto, trabalhar, mas não estou contente, na verdade não traz nenhum prazer. Só se o sujeito pensar que é importante, e eu acho isso tão ridículo, se ele pensar que é importante ele está fora do mundo."



Oscar Niemeyer, pela altura do seu centenário, Diário de Notícias, hoje.