quarta-feira, setembro 27, 2006

Regresso ao lar


Após algumas leituras nos últimos dois ou três Expressos sobre uma corrente emergente feminina intelectual que publica livros e faz conferências acerca do papel fundamental que a mulher tem enquanto fada do lar e que o deve reassumir definitivamente, antes que toda a Humanidade vá definitivamente à sua vida, resta-me só dizer humildemente que está bem e isso tudo desde que:
a) tenha ama (nocturna e diurna como a Catarina Furtado) para os putos vindouros;
b) cartão de crédito/rendimentos de outra origem sempre disponíveis para essenciais à sobrevivência (Spas, trapinhos,viagens, etc) tendo sempre em vista estar impecável para ele (quer fisica quer intelectualmente);
c) staff de pessoal que coordenarei arduamente nas tarefas diárias do lar;
d) carro disponível com chauffer para carregar todos os bens essenciais à sobrevivência (ver b).
Assim, meus caros, renuncio à carreira mais ou menos promissora e regresso ao lar, muito sossegadita, sem ter de provar tanta coisa a tanta gente, armada em fútil para não me chatearem, mas tendo todo o tempo do mundo para fazer secretamente o que me dá prazer.
É a fabulosa era das domésticas “visa gold”!

terça-feira, setembro 26, 2006

De regresso


Viajar faz-nos sentir bem, muito bem e... tão pequeninos!

sexta-feira, setembro 15, 2006

Equívocos


Numa participação de uma das polícias mais famosas do nosso país lia-se recentemente aquando da enumeração exaustiva do rol de objectos furtados, passo a citar:

Um porta chaves com a imagem do "Chega e Vara".

Deduz-se que se tratava do Che Guevara mas, com esta malta, nunca se sabe...

quarta-feira, setembro 13, 2006

Então até já


No colo, naquele colo aprendi a enrolar novelos de lã. Azuis. Amarelos. Vermelhos. Verdes. Naquelas mãos enrugadas reparei que o mundo tinha relevo, montes e vales, rios grandes e pequenos. Avó. Avó. Repeti sempre na certeza que não gastaria nunca aquele nome que não era um nome era um laço só nosso daqueles bem apertados pelo tempo. Naqueles bolsos descobri botões cheios de solidão, rebuçados para a tosse que não tínhamos, pedacinhos de linhas que não serviam para cozer nada, talvez fizessem companhia aos botões. Naqueles óculos vi formigas gigantes e letras pequeninas que escrevia como se delas tivesse medo. Não tenhas medo das letras avó. Não tenho medo, elas fogem destes óculos demoro muito a encontrá-las. Naqueles passos rápidos e seguros tropecei na sua doçura disfarçada de fragilidade. Naquela voz serena avistei todos os outonos e invernos de que me lembro. Pequena vem aqui. E eu ia logo, grande, enorme, por ser assim chamada. Naquele fogão a lenha sentia o cheiro agridoce dos seus cozinhados, amargura com amor misturados em proporções desiguais. Naquelas escadas sentava-me a seu lado ensinava-a os bichos e ela ensinava-me as pessoas. Naquele baú aberto estavam os seus lençóis bordados e as suas mantas tecidas, estranhamente cheirava a castanhas acabadas de assar, estranhamente parecia ter estado sempre fechado. Naquela cama ouvia-lhe todas aquelas dores mudas, era ensurdecedor aquele barulho. Naquele lavatório lavava-lhe o sorriso todas as manhãs porque ela me pedia. Riamos muito com a possibilidade de haver sorrisos atentos, sinceros lavados por mim. Naqueles olhos, minúsculos, há muito escondidos atrás daqueles óculos, aprendi que o que de mais precioso temos deve ser ali guardado. Naquele adeus que não foi um adeus, foi um então até já, quando voltas, já vens não é, descobri que há pessoas das quais nunca nos despedimos.

domingo, setembro 10, 2006

A Mulher que arranhou o Gato





Embora não seja uma especial fã do Nuno Markl dei por mim este domingo, numa esplanada à chuva (aqui já chove!) no meio da tarde, a fazer uma compilação de noticias bizarras da imprensa (Sábado e Expresso) deste final de semana. A bizarria aumenta a cada publicação. Suponho que seja por "questões editoriais", leia-se para vender mais e mais. Se assim não é acho que o mundo está mesmo a enlouquecer ou então sou eu que fiquei parada algures no tempo. Entre loucura, imaginação delirante ou hábitos sui generis deixo-vos aqui quatro amostras.

* da estatistica(da noticia amarela mesmo aqui ao lado) não devem ter conseguido ler nada mas trata-se de uma sondagem feita em Itália sobre relações amorosas e sexo no emprego. 23% confessaram namorar ou até fazer sexo na hora de trabalho e 80% (dos 780 inquiridos) queixaram-se da falta, no local de trabalho, de sitio apropriado para o amor (Hã???). Latinos!

sexta-feira, setembro 08, 2006

Cá dentro


Há um mar que navega em mim. Há uma onda que me empurra na rebentação para ti que dormes irremediavelmente na areia. Há um barco que se afunda frequentemente. Há uma concha que nunca se abre e um cavalo-marinho que queria ser uma sereia e uma sereia que queria ser uma gaivota e uma gaivota que queria ser peixe e um peixe que eu queria ser.
Há um mar que adormece em mim mesmo no Inverno, mesmo quando a nortada me sufoca, há um mar que acorda em mim e é nele que mergulham os sonhos do passado e emergem os sons do futuro.
Há assim em mim um mar, imenso que me ocupa, me arrebata e me deixa pouco espaço para nele desenhar ilhas que me atraiçoem.

quinta-feira, setembro 07, 2006

É cool!


É só a melhor revista virtual que conheço. Dá-vos todas as dicas culturais (mais ou menos alternativas) se estiverem por Lisboa e arredores. A mim, que só vou aí, até ao final deste ano, uma vez por mês, faz-me sonhar acordada.
http://lecool.com/actual.html

quarta-feira, setembro 06, 2006

Mais que mais ou menos




Para espantar a calma e acelerar o tempo desta vida (ainda) insular ando de livro para livro, de filme para filme, de conversa para conversa. As últimas vou poupar-vos, não porque sejam secretas ou especialmente desinteressantes mas porque tenho mais que fazer que transcrevê-las. Assim fica aqui o ultimo livro que li e o último filme que vi (com pipocas e tudo).
“A Instrumentalina” é um conto de trinta e tal páginas da Lídia Jorge que fala de infância, das suas recordações e de um reencontro com elas muitos anos depois. Simples e bem escrito, não sendo nenhuma obra prima, mas tocante em algumas passagens. Bom para ler num bocadinho de tarde ensolarada de esplanada.
“O Capuchinho Vermelho” é um filme que, não sendo hilariante, como esperava (as expectativas é que por vezes lixam tudo!) é bem construído contando a história clássica como se tivesse sido acabada de inventar no século XXI, o que envolve mistério, acção, intriga, polícia, total reconversão dos papeis sociais tradicionais, enfim só falta o sexo mas ainda não foi desta, se bem que há um je ne sais quoi de flirt entre a Capuchinho e o “doce” coelhinho mas, como é uma perversão, os guionistas detiveram-se no “maiores de 4” e controlaram-se.

Fotos de Infância




Agora sou eu a escrever nas paredes do meu quarto de brinquedos. Os pais forraram-nas de papel cenário para reinventar alfabetos e desenhar o sol e as flores de cores a fingir.
Agora sou eu a desenhar na cara das bonecas que insistem em me dar, não as forraram com papel cenário e, no meu alfabeto, escrevo na testa e na boca da Tucha “Onde está o meu irmão?”.
Agora sou eu perto de um poço, o meu irmão não veio porque os meus pais não deixaram. Já desenhei um irmão e deram-me outro em forma de urso de peluche, pode ser que sirva!
Agora sou eu a apanhar os animais que o meu pai também desenha mas com a sombra das mãos. Alguns são maus e eu sonho com eles, acordo, dão-me um biberon de leite com chocolate e retomo um sonho de outra cor.
Agora sou eu no fundo das escadas, acho que elas me partiram um braço cansado de estar inteiro, depois do gesso vou jogar ao elástico. Descobri que as minhas escadas tiveram pontaria, não posso escrever os números no teste de matemática!
Agora sou eu e os meus berlindes na praia. Perdem-se na areia, rouba-mos o mar. Peço à mãe que me compre outros.
Agora sou eu no cinema, subo a pique e alcanço o topo da cadeira, grito “Cuidado!” no momento em que a mãe do Bambi ia morrer. Aviso sempre todos os desenhos animados mas descobri a custo que nunca vou falar suficientemente alto para me ouvirem… acho que estão muito longe. Vou guardá-los na parede do meu quarto de brinquedos quando chegar a casa.
Agora sou eu e o gato que me arranha e eu arranho-o também porque sou um gato… mas ele não sabe.
Agora sou eu de novo, acho que o mundo encolheu num ápice, foram poucas as pessoas que ficaram maiores, aprendi o alfabeto dos outros mas até agora ainda não me conseguiram ensinar o caminho que quero aprender.

domingo, setembro 03, 2006

Projectos


Queria ser

Cabeleireira
Treinei incansavelmente na Tuxa, esgotei-lhe o cabelo e a paciência dos que me educavam
Não fui.
Bailarina
Aprendi durante quatro anos, doíam os joelhos e os pés, guardo as sapatilhas
Não fui.
Agricultora
Mexi na lama, nos bichos, nas raízes das plantas, mergulhei nos açudes compulsivamente. Ainda o faço. Em part-time
Não fui.
Nadadora
Porque o mar é mais forte que (quase) tudo. Depois de muito cloro e treinos diários sentia-me cada vez mais em terra
Não fui.
Cozinheira
Aos primeiros brigadeiros endurecidos enfureci
Não fui.
Médica
Mas passou-me logo quando vi a dor
Não fui.
Arqueóloga
E descobrir literalmente o passado. De repente interessou-me mais o presente
Não fui.
Arquitecta
De olhos nas fachadas, nos pormenores. Apercebi-me das minhas imprecisões e indecisões
Não fui.
Advogada
Fiz curso e tudo. Desisti da ideia, conclui-a demasiado “nãoeu”. Há quem tenha coragem e feitio. Admiro
Não fui.

Então tento ser

Salvadora do mundo(passo a imagem bíblica e megalómana)
De olhos nos jornais, nas pessoas. Descobri que posso simplesmente tentar salvar o meu quotidiano salvando o dos outros e vice versa sem grandes ambições, com pequenas acções.
Tenho dias.
Viajante
De olhos abertos ou fechados. Com dinheiro e aviões, a pé pela cidade onde habito e de bolsos vazios. Conhecer tudo. Ansiosa. Demoradamente.
Ando a tentar...
Escritora
E sou aqui, em segredo, só para vocês. Com mais ou menos jeito. Sou dentro do meu portátil, da minha gaveta, das minhas mãos. Sou desde sempre, pelo menos, cá dentro.

Socorro!


Dou por mim a temer fazer zapping assim que finda o telejornal. O problema está identificado: a programação deprimente dos canais generalistas privados que resolveram apostar e nos arremessar com a famosa (e fabulosa!?) ficção nacional. É neste momento, e só neste, que fico feliz por ainda não ter uma criancinha que monopolize o comando em prime time. Tudo é mau: os textos, as cores, os cenários, os tons de voz, a mensagem. Admito que num caso seja muito menos fútil e talvez roce o conceito de “educativa” “Não tenho nada, mas tenho tenho tudo, sou rica em sonhos e pobre pobre em ouro(...)” mas perde pontos de imediato quando, tirando as más da fita, nos apercebemos o quão irritantes, xaropozas, mal vestidas e limitadas são as personagens principais. Já ouvi um “a gente vamos” e não sou, obviamente, espectadora frequente. Mudando de canal, e alertada pelo meu melhor amigo, esse sim espectador assíduo (?!), temos um grupo de adolescentes que vivem sabe-se de lá do quê, não fazem nada de jeito durante todas as férias de verão (para não dizer todo o ano) têm sempre bikinis novos todos os dias e namoram, acabam de namorar, recomeçam, traem, dançam, bebem, namoram e criam intrigas, muitas intrigas. Dizem-se o reflexo desta juventude que assim sendo é a mais vazia, fútil, irresponsável, néscia, inactiva de todas as juventudes que já ouvi falar.
Resumindo temos por um lado um remake da Cinderela (mas mais feia, menos ingénua, mais burra e sem o sapatito que tanta graça lhe dava) que diz que tudo o que é bom é “refixe” e por outro um remake da série brasileira “Malhação” com adolescentes despidos ou vestidos mas com vontade de se despirem. E é nestas alturas, sobretudo sabendo que 2/3 das audiências destes dois programas estão na faixa etária abaixo dos 15 anos, que tenho saudades da fabulosa “Árvore dos Patafúrdios” ,das curtas do Vasco Granja, do “D’Artacão” e de todos os outros que por certo se estarão a lembrar. Relativamente ao outro terço, acima dos 40, fico saudosa das novelas brasileiras, tão criticadas, mas que se tornaram clássicos e que tanto nos divertiam como a “Dona Xepa”, “A guerra dos sexos”, “Dancing Days”, “Tieta do Agreste”, “Roque Santeiro”. Resta-me assim, em prime time, apagar, resignada, a televisão e ir obrigatoriamente fazer alguma coisa de jeito.

Para esquecer.


As dores nas costas voltaram de novo. O portátil diz que não encontra o sistema operativo. A secretária está vazia de interesse. Apareceu um sinal (discreto) mesmo no meio da testa. A humidade está a 95%. Faltam duas semanas para Paris. O queijo do pequeno almoço era plastificado. O pesadelo foi (quase) real. A borbulha cresce ao ritmo alucinante das olheiras. Levantar (muito) cedo. Obras no piso inferior. Falta tempo e pachorra para arranjar as unhas. Falta inspiração para escrever. As ideias não regressaram das férias que ainda não tive. Há (leves) ataques de hipocondria. Impossível descobrir um livro de jeito para substituir o que acabei de guardar. Há um elevador que chia entre o primeiro e o segundo andar. Há um sol quente que não brilha. Há um candeeiro coberto de pó. Há dias muito difíceis.