O fim de ciclo deixa nas minhas mãos recordações que ora se acentuam ora se desvanecem numa ampulheta entupida com os nossos grãos. Confusa, ansiosa, triste, deito-me na relva fresca e tento acompanhar as nuvens que passam apressadas. (Re)memorizo a minha agenda dos próximos dias, prazos, aniversários, reuniões, idas e voltas, respostas. Tudo cancelado. Oiço o 112 ao fundo, aproximando-se apressado da nossa vida, da tua morte. O telefone toca, agora não posso atender, estou naquele barco à vela a caminho da tua foz. Este fim de ciclo é ruidoso e perseverante, contraria-me. Abro o portão, corro escada acima, conduzo, autómata, guiada pelo teu olhar que insiste em não me reconhecer. Entretanto, cá dentro, adormeci, profundamente cansada, sob o sol morno de fim de tarde.
terça-feira, junho 28, 2011
terça-feira, junho 21, 2011
sábado, junho 18, 2011
quotidiano e sonhos simples (ainda) de criança
sexta-feira, junho 10, 2011
Imagine
Imagine que é eleito democraticamente deputado para o Parlamento Europeu. Voa para Bruxelas e vai comer nos melhores restaurantes, passar os fins de tarde nas melhores lojas e voar, nos tempos livres, para os melhores destinos. Claro que, no meio de tudo isto, tem tempo para cumprir o seu dever, propor umas coisas, contestar outras, indignar-se frequentemente. Agora imagine um deputado que talvez até faça tudo isto com um bocadinho menos de frequência, mas que põe, todos os meses, 1500€ de lado para atribuir bolsas a projectos de investigação. Imagine se todos os deputados fizessem algo semelhante, se todos se indignassem um bocadinho menos e praticassem um bocadinho mais... imagine.
quarta-feira, junho 08, 2011
Zapping de vida
Ontem, descansando um pouco nesta época em que sinto que não tenho mesmo mãos a medir, fiz um zapping mais demorado por quase todos os canais. Parei numa entrevista com a Ingrid Betancourt que contava, em versão compacta e retocada, a sua experiência de prisioneira na selva, sob o gume das FARC. Ela chegou a um desespero tal que se perguntou afinal que pessoa queria ser. Definiu-a, sem grandes ambições, e transformou-se nessa mesma pessoa que sempre estivera ali dentro, sobreviveu-se. Esqueçamos assim os modelos, as pressões sociais, os equívocos. Devemos ser quem queremos, deixar que essa ambição se torne rotina, que essa rotina, por fim, seja cada um de nós.
segunda-feira, junho 06, 2011
Ressaca eleitoral
Ontem fiquei sentada no sofá, palavras em directo atrás de palavras em directo, cores que se diluem, pessoas eufóricas e adormecidas, ecos que soam melhor que os discursos.
Portugal tem dificuldade em apaixonar-se. Saltamos de relação em relação numa estratégia insana de fuga para a frente. O argumento para mudar é irrepreensível: já não aguentamos mais. Não amamos o futuro mas odiamos o passado. Fecham-se ciclos por fastio, ligeira desilusão, por irresponsabilidade viciante. Desiste-se do Norte de África porque já não está a dar, atravessamos todos os oceanos primeiros cheios de esperança, de regresso mergulhados em tédio. Os franceses vinham por aí, Portugal já não estava a dar, buscámos o Brasil e depois voltámos, enjoados de tropicalidade. Aguentámos guerras e ditaduras, deixando que o tempo decida por nós. Casamos por conveniência e escrevemos poesia sobre essa infinita tristeza que nos dá o conformismo. Há muito que não ouvimos bater o nosso coração. Talvez o tenhamos deixado pendurado na ponta das armas junto com os cravos vermelhos, talvez abandonado num porão de uma nau afundada pela ganância.
Portugal tem dificuldade em apaixonar-se. Saltamos de relação em relação numa estratégia insana de fuga para a frente. O argumento para mudar é irrepreensível: já não aguentamos mais. Não amamos o futuro mas odiamos o passado. Fecham-se ciclos por fastio, ligeira desilusão, por irresponsabilidade viciante. Desiste-se do Norte de África porque já não está a dar, atravessamos todos os oceanos primeiros cheios de esperança, de regresso mergulhados em tédio. Os franceses vinham por aí, Portugal já não estava a dar, buscámos o Brasil e depois voltámos, enjoados de tropicalidade. Aguentámos guerras e ditaduras, deixando que o tempo decida por nós. Casamos por conveniência e escrevemos poesia sobre essa infinita tristeza que nos dá o conformismo. Há muito que não ouvimos bater o nosso coração. Talvez o tenhamos deixado pendurado na ponta das armas junto com os cravos vermelhos, talvez abandonado num porão de uma nau afundada pela ganância.
Portugal tem dificuldade em apaixonar-se, cai institivamente nos braços ténues da sua própria esperança, cheio de azedume. Talvez Portugal, cansado, faça tudo para não ter de suportar a solidão.
Subscrever:
Mensagens (Atom)