terça-feira, fevereiro 27, 2007

o que mudou e o que não mudou


Regresso definitivamente a Lisboa na sexta dia 2. Nem estou ainda a acreditar. Embora vá lá uma vez por mês sinto, agora no regresso, que chego a uma cidade um pouco mudada. Há mais uma ou outra radial, mais um ou outro centro comercial, pode-se falar ao telemóvel no metro, a programação dos centros de cultura está cada vez pior, o Saldanha está um caos, há túneis a postos para serem inaugurados (talvez antes das eleições antecipadas), há tapumes a retirar e a colocar em outro lado, aleatoriamente, há outros percursos, há, por fim, uma casa restaurada para chegar ao fim do dia.
Sei que eu chego também diferente, com as mesmas manias e teimosias, com mais cabelos brancos, mais remendos e muitos sorrisos, de alguns que por aqui encontrei, guardados nas duas imensas malas. Dois anos foram um ápice de felicidade e de problemas, de dificuldades e de golpes de sorte, de radicais afastamentos e de surpreendentes aproximações, de esforço intenso e de preguiça acumulada ao sol num destes prados verdes. Levo numa mão este mar intenso, imenso, indomável e na outra o optimismo e a esperança de sempre.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

A dificil arte de escrever alguma coisa que preste

Ando stressada com, mais uma vez, as mudanças da minha vida. Ainda não sei qual o dia desta semana que me deixam voltar definitivamente a Lisboa. Entretanto devido às despedidas, às insónias, aos projectos do futuro imediato e aos pensamentos perdidos não consigo escrever nada que preste. As sinapses não estão a ser feitas devidamente suspeito...

terça-feira, fevereiro 20, 2007

Eusoutuetueu












Lia ontem, na livraria do costume, esta pequena história cheia de sabedoria oriental. Fala sobre a dificuldade que todos temos de sair de nós e encontrar o outro e sermos, nessa árdua tarefa, correspondidos. Talvez por isso vivemos na era da solidão.

Numa aldeia da China profunda um jovem enamorado resolve ir visitar a sua amada que sabe que o corresponda naquele amor. Assim, chega a casa dela e bate à porta.
Quem é ? – pergunta a jovem.
Sou eu. – responde o jovem enamorado.
Ela entristece-se com a resposta e pede-lhe que vá meditar sobre ela para a floresta.
O amor tem destas coisas e o jovem lá foi meio baralhado e triste por ter de alguma forma magoado a sua amada.
Uns meses depois sentiu-se preparado, voltou a bater-lhe à porta.
Quem é? – pergunta a jovem.
Sou tu – responde o jovem enamorado sabiamente.

E por isso vos digo, à boa maneira ocidental, que viveram felizes para sempre.

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Depois de dizer sim

O Sim ganhou por minha culpa e por culpa de quem se mobilizou para prencher o mesmo quadradinho. Nada contra os argumentos (os sérios) do Não. Mas tudo a favor dos do Sim. Depois desta discussão, a qual passou ao largo da maioria dos portugueses, preocupados em pagar dividas, arranjar emprego e hora de consulta no médico de família, importa fazer alguma coisa de jeito, para variar, sobre o planeamento familiar e a educação sexual neste país, as questões cruciais que nos levam a discutir horas a fio outras que se limitam a ser a sua consequência. Afinal somos oficialmente um país civilizado, laico, do primeiro mundo, membro da UE. Oficialmente.

sábado, fevereiro 17, 2007

Sonhar (quase) acordada


Desde há duas semanas que ando a sonhar que estou grávida. Não estou. Nunca estive. Gostaria, daqui a uns tempos. Hoje, finalmente tive a criança sem dor (viva!), só com ansiedade. Dada a insistência deste sonho tentei desvendar o seu significado além do básico que a Psicologia adianta e que não se encaixa aqui: sonhamos com o que muito tememos ou com o que muito desejamos. E saiu isto:

Gravidez: Feliz aumento de bens, eis o presságio para uma mulher que sonhou com gravidez; homem sonhar com gravidez é aviso para que não se exponha, não cometa excessos.
Parto: Se, em sonho, você assistiu a um parto, saiba que brevemente terá a ajuda de pessoa amiga. Você ou outra pessoa em trabalho de parto é prenúncio de que participará de uma óptima companhia e projetos serão levados a cabo.


E não é que é?! Em 2007 vou ser uma rapariga mais esotérica. Acompanham-me? Não me parece...

As palavras dos outros no meu regresso

A Máquina Fotográfica

É na câmara escura dos teus olhos
que se revela a água
água imagem
água nítida e fixa
água paisagem
boa nariz cabelos e cintura
terra sem nome
rosto sem figura
água móvel nos rios
parada nos retratos
água escorrida e pura
água viagem trânsito hiato.

Chego de longe. Venho em férias. Estou cansado.
Já suei o suor de oito séculos de mar
o tempo de onze meses de ordenado;
por isso, meu amor, viajo a nado
não por ser português mal empregado
mas por sofrer dos pés
e estar desidratado.

Chego. Mudo de fato. Calço a idade
que melhor quadra à minha solidão
e saio a procurar-te na cidade
contrastada violenta negativa
tu única sombra murmurada
única rua mal iluminada
única imagem desfocada e viva.

Moras aonde eu sei.
É na distância
onde chego de táxi.
Sou turista
com trinta e seis hipóteses no rolo;
venho ao teu miradoiro ver a vista
trago a minha tristeza a tiracolo.

Enquadro-te regulo-te disparo-te
revelo-te retoco-te repito-te
compro um frasco de tédio e um aparo
nas tuas costas ponho uma estampilha
e escrevo aos meus amigos que estão longe
charmant pays
the sun is shining
love.

Emendo-te rasuro-te preencho-te
assino-te destino-te comando-te
és o lugar concreto onde procuro
a noite de passagem o abrigo seguro
a hora de acordar que se diz ao porteiro
o tempo que não segue o tempo em que não duro
senão um dia inteiro.

Invento-te desbravo-te desvendo-te
surges letra por letra, película sonora,
do sendo à vogal do tema à consoante
sem presença no espaço sem diferença na hora.
És a rota da Índia o sarcasmo do vento
a cãibra do gajeiro o erro do sextante
o acaso a maré o mapa a descoberta
dum novo continente itinerante.



José Carlos Ary dos Santos
Obra Poética
Lisboa, Edições Avante, 1994

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

a moral da vingança

"A vingança é salutar ao carácter; dela brota o perdão". Graham Greene

terça-feira, fevereiro 13, 2007

A mim não me enganam...


Nos voos não se passam só coisas assustadoras...
Num destes meus voos frequentes tive o “privilégio” de me sentarem no último lugar. Como sou devia ficar contente porque é mais próximo da saída mas, por outro lado, tem contras como por exemplo fazer muito mais impressão a descolagem ou ser barulhento. Mas não vos vou maçar mais com isto... Neste voo foi óptimo vir naquele lugar pois permitiu que ouvisse as conversas das hospedeiras que, diga-se de passagem, eram bem mais animadas que o habitual para aquela hora da manhã. Tagarelavam divertidas sobre coisas mais ou menos fúteis até uma delas resolver contar esta história que se passou recentemente no aeroporto de Lisboa: a uma senhora da aldeia, que vivera isolada, devido aos rigores da vida e do marido, foi oferecida, aquando da sua viuvez, por um filho emigrante em Boston, uma passagem aérea para que ela o visitasse. Sem hesitações e com o espirito aventureiro que lhe restava, a senhora, para matar saudades, lançou-se sozinha nesse mundo desconhecido que é a aviação. No dia e hora marcada dirigiu-se ao aeroporto de Lisboa para as devidas formalidades de embarque. Correu tudo muito bem até passar a porta de embarque e se deparar com o autocarro que a levaria ao avião. Pousou a bagagem de mão e recusou-se a entrar. Uma assistente no local quis saber os seus motivos e ela, indignada, avisou que sabia que a estavam a enganar, que não era nenhuma tola porque o filho lhe tinha enviado um bilhete de avião para Boston, não era para ir de “carreira”. Explicaram-lhe a custo e o comandante, depois de saber do sucedido, pediu à tripulação para que a sentasse em primeira classe proporcionando-lhe ainda outro luxo que nunca tivera.