terça-feira, fevereiro 09, 2010

Porno-autocarro

As maravilhas de um autocarro lisboeta pela manhã. Porque está frio, está calor, está a chover, tenho sono, tenho preguiça, estou de saltos, hoje não consigo, quero, posso ir a pé.
E assim lá vou no meu banco preferido virado para todos, de costas para o motorista, a fingir que estou a ler ou a ouvir qualquer coisa mais ou menos erudita, a ver as modas, cheirar a população activa, a contar as rugas e banhas e pelos nas carecas de quem passa.
O que mais gosto é ouvir, telefonemas, conversas, desabafos, suspiros. Posso fingir que estou melancólica olhando pela janela a chuva cair e morrer de riso ou de espanto ou de indignação ou de tédio. Depois há as expressões correntes a senhora que pede “sr. motorista dê um jeitinho aqui atrás” ou a criança, que não para um segundo quieta no corredor, a quem a mãe insiste em dar um pequeno almoço volante e tardio” Diogo anda-me comer, já disse, anda-me já aqui comer”. Do porno-autocarro olho para todos os solitários pesarosos nos seus veículos neste cortejo matinal, por companhia locutores de rádio matinais insuportáveis, falando já com os chefes autoritários, ouvindo as lamúrias das esposas que insistem em mudar de condomínio, suando pelos atrasos no parquímetro, estrebuchando com a conta da oficina. Olho para eles e, aqui deste banco aveludado de padrão com gosto duvidoso, entre um toque de campainha e uma travagem brusca, caramba, sinto-me cheia de sorte.

1 comentário:

Joana disse...

Um mimo, caramba!, este post está um mimo. :))))

Eheheheh!



Jinhos.