terça-feira, fevereiro 26, 2013

Simples


Tim Burton


Seguem sorrisos amarelos sobre a passadeira vermelha. Elas param para dizer que estão felizes, alegres, contentes, radiantes e para publicitarem o nome do modelito e da jóia que usam. Eles param para dizer como estão felizes, alegres, contentes, radiantes e para publicitarem o nome da mulher, em geral 20 a 30 anos mais nova, que trazem pelo braço. Todos focados no lucro desses anúncios. Alguns trazem atrelados familiares não tão bem vestidos ou declaram que foi um instantinho para se aperaltarem. Não dão importância a futilidades e querem muito fazer um próximo Almodovar ou um dos Cohen. Ninguém se lembra de perguntar onde foi adquirido o silicone já da colecção primavera-verão 2013, que é feito do amor-da-vida do outono-inverno 2012  ou porque aquela rapariga tem umas olheiras que condizem com o ar perdido. Depois há a cerimónia nunca tão engraçada como se esperava. Uma plateia onde o talento está concentrado em poucos e o investimento na beleza em muitos. Umas escadas que são um verdadeiro desafio para as senhoras premiadas enroladas em km de tecido e para as pessoas bêbedas em geral. Um homenageado morto ou em decadência. Uma música emblemática. Uns estrangeiros que dão um toque exótico tão apreciado em Hollywood. Uma ou duas gaffes, três ou quatro piadas de mau gosto. Por fim, pessoas sorridentes com pequenos senhores dourados, com o nome do tio de alguém, nas mãos que serão utilizados para os mais diversos fins. Carreiras que disparam, morrem, amarguram. E mais uma noite em branco a tentar entender a importância da simplicidade que tudo isto tem.

segunda-feira, fevereiro 25, 2013

Aquém das nossas possibilidades...

...intelectuais, de cidadania é  como temos vivido, conclui Rui Tavares na sua crónica de hoje na última página do jornal Público. Porque este é o único discurso politico que verdadeiramente me interessa.

quinta-feira, fevereiro 21, 2013

não dá

Apetecia-me escrever sobre a canção de intervenção em Portugal e o seu efeito (in?)útil. Apetecia-me escrever sobre o tempo que não tenho, a motivação que não tenho ou, dependendo, sobre o tempo que me sobra e o entusiasmo que me sufoca. Apetecia-me  escrever sobre a ciência de dizer palavrões articuladamente ou sobre o facto de, hoje em dia, haver uma campanha subliminar do politicamente correcto para a higienização da língua portuguesa. Escrever sobre as viagens que fiz mas, sobretudo, sobre as que não fiz e que já não cabem dentro de mim. Apetecia-me dissertar sobre a esperança, relatar as presenças mais entusiasmantes num festival literário, dizer mal e bem dos últimos filmes ou livros vistos e lidos. Apetecia-me moldar o amor em palavras, elogiar a democratização que resulta do low cost ou deleitar-me com o luxo dos pormenores que diferenciam. Enunciar as qualidades de um dia de sol ou lamentar os defeitos da humanidade urbana e mediocre que povoa os dias. Apetecia-me ironizar com os quotidianos pontapés na gramática  ou sugerir aquele restaurante italiano onde fui, um destes dias, pela primeira vez. Mas, infelizmente, deparei-me com o meu recibo de vencimento deste mês e, pronto, lá emigraram para longe palavras e inspiração.

sexta-feira, fevereiro 15, 2013

A foto e o puto

A foto
e
o puto desempregado que não tem dinheiro para comprar material fotográfico e que pensa seriamente em emigrar.

Constatar





Sempre que leio um jornal nacional, um post, actualizo as leituras no facebook ou oiço clandestinamente conversas de café,  reparo que os portugueses fazem uma coisa de forma exímia. Somos muito bons a constatar. Admito que sejamos ainda melhores a dar indicações alternativas para que o trauseunte, já de si perdido, possa chegar, um dia quiçá, ao local pretendido. Mas os dotes para constatar também não ficam em nacionalidades alheias. Daí a recente obsessão pelo Excel e pelas estatísticas. Gostamos de fazer contas de merceeiro e saber que o resultado é certo. Ponto. Isto está mau. Constatamos. Hoje está frio. Ele cheira mal. A conta do supermercado subiu. A vizinha faz muito barulho. O mar está calmo. O carro tem um risco novo. E de constatação em constatação vamos saltitando até à grande constatação final. Entre constatações criamos breves sinapses opinadoras, frequentemente sem qualquer outro fundamento que os nossos pequenos interesses ou afectos. Constatar seguido de pensar é um avanço civilizacional sem precedentes, talvez a chave para mudar tudo, para "refundar" com sentido. Por ora, e cumprindo o meu quase-dever de cidadã portuguesa, deixo-vos a minha modesta constatação de hoje: é sexta-feira, sexta-feira, sexta-feiraaaaaaaaaaaaaaaaaaa!


quarta-feira, fevereiro 06, 2013

Poema que aguenta, aguenta

João não tem um tostão
tem o ar que respira
mas ao contrário:
Expira
Inspira.
João é agora empreendedor
inspirado
pelo ar ao contrário
e pela dor num armário
já penhorado.

João caminha
pelas veredas da esperança
e isso cansa.
Cansado e inspirado
empreende
em formas gratuitas
e legais
de suicidio,
de vida.

João corre
no limiar do sonhos
dos outros.
Acelera nos minutos
enfadonhos e
crê que, se tudo falhar
(até o suicidio),
tem sempre um último projecto
já sem paciência
e com muita concorrência
viável mas banal
tão inevitável quanto global.

João venderá,
quase como nova
portátil, retractil, útil,
o que lhe dá alento para
aguentar
aguentar
com pericia e calma.
João, dizia,venderá
a preço de saldo
a sua alma.

segunda-feira, fevereiro 04, 2013

Um seguro contra (os erros d) o passado

Para imprimir e colocar na porta do frigorifico.

Ter um seguro contra o futuro



Ontem na Lx Factory - Espaço Brasil, JP Simões versão semi-sul americana. Um concerto animado, lúcido, divertido ao som do samba deles mas com o nosso fado nas palavras.