(...)
Minha luz dos olhos que eu vi nascer
Num dia tao breve a clarear
As águas do rio são de correr
Cada vez mais perto sem parar
Sou como o morcego vejo sem ver
Sou como o sossego sei esperar.
Zeca Afonso, Canção da Paciência
Há dias que desperto para Lisboa e ela presenteia-me com ternura, com alegria, com estupefacção (e até mesmo com algum horror). Ontem começou logo pela manhã. Uma lição de ecologia. Montada no híbrido mais mais do mercado, obedecendo a um demorado sinal vermelho, falava alegremente em alta voz enquanto bebia um iogurte líquido e fumava (três coisas, ao mesmo tempo, sim). Arrancou suavemente, não sem antes atirar a beata seguida da embalagem de iogurte pela janela. De regresso a casa, noto uma mulher jovem um pouco adiante no passeio, empurrando um carrinho de bebé e enquanto falava de forma entusiasta com uma outra que a acompanhava. Reparo que lhe faltava pano nas costas da camisola, no seu lugar estavam, lado a lado, em leque, tatuados três bebés com um ar amoroso. No topo de cada um, também tatuada, uma fita ao vento com os respectivos nomes: Cristiana, Fabiana e Venusiana.
Num almoço animado brincavam com a definição de tipo de cada um e de como isso tinha mudado (ou não, em casos de teimosia radical) desde que se lembravam do que é estar apaixonado. Chegou a minha vez de brilhar sob os holofotes. E tu, qual é afinal o teu tipo? Respondi - porque depois de procurar bonito, espantoso, inteligente, criativo, charmoso cheguei a um adjectivo-chave - bondoso. Gargalhada geral. Definitivamente não percebo algumas das (minhas) piadas. 