
" O mais nobre de todos os cachorros é o cachorro quente: ele alimenta a mão que o morde".
Laurence Johnston Peter (hoje, na Única - Expresso).

têm MESMO de ir aqui
Presa em casa num fim de semana trágico, oiço a Amy cantar will you still love me tomorrow e temo pela incerteza, um dos meus maiores medos, um dos meus maiores estimulos.
Tenho ido aos saldos numas quantas horas de almoço em tentativas sucessivas de fazer uns milagres sazonais. Procuro a intemporalidade e talvez uma gabardine a, pelo menos, metade do preço. Encontro flores, folhos, tacões, lantejoulas, números improváveis e cores indescritíveis que florescem em qualquer armário. Encontro amigas tagarelas, homens semeados às portas das lojas e, apáticos, abandonados em cadeiras e sofás, encontro crianças há muito adormecidas sobre rodas. Encontro o que não procuro, ganho fôlego e paciência, e regresso para uma nova tentativa, quiçá, ainda hoje.
Valter Hugo Mãe confessava ontem à Judite de Sousa, numa entrevista a propósito do sucesso na Festa Literária de Paraty , que ansiava ser pai porque guardava um tipo de amor específico, forte, incondicional que só poderia ser activado se tal acontecesse. Um amor inaproveitado que preenche, ali dentro, um enorme vazio.
Descobri Forrest Gump. Tropeçei nele ontem, numa Fox qualquer, mesmo no início. Em 1994 achei que tinha coisas mais importantes que fazer que desperdiçar duas horas a ver o Tom Hanks. Enganei-me. Se há alguém que ainda não viu, não se arme em parvo e não espere outros vinte anos.
Há uns anos descobri que era crescida quando num aniversário infantil, no princípio de uma história que ia contar à pequenada, me perguntaram de quem eu era mãe. Não exerci qualquer admoestação sobre o pequenote mas tenho a certeza que a história saiu menos inspirada. Recentemente convivo mais com uns primos juniores, um mini grupo dinâmico e divertido entre os 2 e os 4 anos. Depressa percebi que me tomam como igual, diluem, como eu, as grandes barreiras cronológicas e não estranham esta Gulliver que os faz rir. Temo que quando crescerem alguém lhes perguntará, nas mesmas circunstâncias, de quem são mães e pais. Adivinha-se indignação, prova de que o ADN não engana.
Encontramo-nos nos funerais. Reconhecemo-nos. Desconhecemo-nos, espantamos, morremos de amor ou de inveja. Rimos perdidos na escuridão daquele humor. Choramos por todos os motivos que já até tínhamos esquecido. Nos funerais fingimos, estar tristes, estar indiferentes, fingimos rezar, penamos por ali estar. Fingimos que a dor tem cor e que apaga todo o cortejo de más memórias. Nos funerais a alma encomendada sussurra fé e medo aos nossos, irremediavelmente egocêntricos, ouvidos. Nos funerais entristecemos, comemoramos, morremos e renascemos. Encontramo-nos também ali, nos funerais.