Nesta estrada preta rolando, luzes e luzes de moldura, uns dormindo outros falando de banalidades com quem os espera, outros ainda alienados do mundo ou de si, não dá para averiguar. Outros ainda, eu, a pensar por onde andarás. Imagino-te num automóvel, despenteado, a meio de uma discussão definitiva, daquelas que nos empurram dilacerados para a frente. Imagino-te na varanda, enrolado numa manta que te vou oferecer, ignoras a temperatura nórdica de Genebra e, sem saber, fazes um cheque-mate a tudo o que não conseguias, até ali, dominar. Imagino-te a caminhar, pelos Pirenéus ou pelo bairro, sem cão, só a caminhar à procura de um pretexto. Caminhas por aí preocupado, livre, descontraído, assustado. Imagino-te a escolher um caminho, entrares naquela rua estreita de Amesterdão, cheia de pequenas lojas, onde vais descobrir inesperados presentes para os que amas. Experimentas uns sapatos que te fazem desistir da ideia de alugar uma bicicleta, as alterações de planos são o teu forte. Agora sei-te numa secretária, cumprimentas com simpatia e timidez, habilidoso a esconder o que importa. Tens uma vista e um gabinete onde não cabe nenhuma das tuas ideias, um pequeno aquário que te liberta da claustrofobia, nenhuma gaveta trancada. Imagino-te temendo o tempo porque ainda não me encontraste, não te podes enrolar na manta nem fazer cheque-mate, nem pedires que embrulhem aquele livro raríssimo descoberto na rua estreita e que tanto quero ler. Meu amor, o tempo urge, bem sei, mas descansa, o nosso é já amanhã, hoje estou por aqui nesta estrada, a meio da noite, novamente a imaginar-te e isso deve querer dizer alguma coisa.
segunda-feira, novembro 29, 2010
terça-feira, novembro 23, 2010
80 anos dele
As Musas Cegas
(...)
Há gente assim, tão pura. Recolhe-se com a candeia
de uma pessoa. Pensa, esgota-se, nutre-se
desse quente silêncio.
Há gente que se apossa da loucura, e morre, e vive.
Depois levanta-se com os olhos imensos
e incendeia as casas, grita abertamente as giestas,
aniquila o mundo com o seu silêncio apaixonado.
Amam-me; multiplicam-me.
Só assim eu sou eterno.
Herberto Hélder
quinta-feira, novembro 18, 2010
FMI
Há dias que só me apetece desaparecer para longe. Fazer a mala, marcar quatro golos a Espanha, romper as três zonas de segurança da Cimeira da NATO a toda a velocidade, apertar a bochecha ao Obama, dar canelada ao Sarkozy e tirar o pipo à Merkel. Apanhar um avião imenso que voasse baixinho e servisse perdiz e vinho tinto inexplicável para erradicar o medo. Aterrar no paraíso, em outra Lisboa, onde todos sorriem porque são felizes com o seu modelo de governo assente na educação e cidadania, onde não há subúrbios, nem crianças arfantes, jovens sem esperança, adultos esgotados, velhos sem vida. Quero aterrar nessa cidade branca e azul que parte do Tejo todos os dias para novas descobertas, onde a crise só seja temida se for de valores ou de ideias, onde a sigla FMI só pode querer abreviar Felicidade Mais Intensa.
quinta-feira, novembro 11, 2010
A falta
Era frequente encontrá-lo no início da Av. Fontes Pereira de Melo, acenando a quem passava. Seria loucura, perversão, obsessão, falta do que fazer? Há uns anos, depois de uma excelente peça jornalística sobre ele, entendi que era só feitio. Acenar a quem passa sem qualquer retribuição, ambição, compulsão. Morreu o Senhor do Adeus. Talvez poucos entendam a falta que ele nos faz.
quarta-feira, novembro 10, 2010
Sonhos férteis
O sonho
Sonhe com aquilo que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que quer.
Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.
As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor das oportunidades
que aparecem em seus caminhos.
A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passaram por suas vidas.
Clarice Lispector
segunda-feira, novembro 08, 2010
Um sonho de realidade
- Papa visita Barcelona e cruza um núcleo gay que desata, nesse preciso momento, aos linguadões;
- Autocarro do Benfica dirige-se para a cidade do Porto ladeado por centenas de luzes azuis (dos srs. polícias)que premonitoriamente o ofuscavam (vide resultado do jogo);
- A China oferece-se para comprar a dívida portuguesa, num gesto grandioso de generosidade a que aquele país tem habituado todo o planeta.
Apartada dos tortuosos meadros da mente a realidade de segunda feira revela-se serena: o mesmo despertador, a mesma chuva sonsa de Outono, as mesmas queixas no autocarro, o mesmo bicho na castanha.
quinta-feira, novembro 04, 2010
Reflexão pós debate orçamental e pré cataclismo social
"Hoje em dia, quando todos os partidos nos traíram, quando a política corrompeu tudo, não resta ao homem senão a consciência da sua solidão e a fé nos valores humanos individuais. Não podemos pedir a ninguém que seja justo no meio da demência universal.(...) Mas pelo menos não podemos forçar ninguém a ser injusto. Conscientes do que fazemos, recusaremos a injustiça enquanto pudermos, e serviremos o indivíduo contra os adeptos do ódio anónimo".
Albert Camus
Ou seja : "Estes gajos não têm nível. Temos é de fazer a nossa vidinha honesta e não lhes ligar peva. Assim aprendem logo".
Sr. António do Café
Os meus concertos em Outubro II
Rita Redshoes (a nossa Audrey Hepburn) na Aula Magna cantarolando alegremente músicas dos seus dois cds.
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