quarta-feira, dezembro 12, 2007

É Natal!



Depois de muito trabalho, respiro. Descobri hoje que vou de férias amanhã mas só descanso na semana do Natal! Confusos? Eu também. Não vos maço com explicações sobre o quão banais são pessoas idiotas. A parte boa do dia: estou finalmente a escrever no meu blog e, hoje pela manhã, pus um colar amarelo (?!).
O Natal aí está, pelo motivo acima adiantado suspeito que não conseguirei passar por aqui antes do dia 25. Este ano estou tão preocupada e tão, como direi, lisa, com tão pouco tostãozito que ainda não incorporei o espirito do Natal. Comprei já os presentes para os pais e para as crianças. Os outros vai de beijos, postais e tempo, quando o tiver, em breve. Quero dar mais tempo aos meus verdadeiros amigos. Quero dar mais tempo aos meus escassos e corajosos leitores. Proponho-me. Acho mais verdadeiro que "Prometo".
Quanto a tudo o resto que se anda aí a passar... posso-vos dizer que me entristece e me faz rir (tudo isto em simultâneo, sim pareço louca). Desde os milhentos pais natais que trepam as varandas e as chaminés das maisons do nosso país até ao discurso do Sócrates na Cimeira UE- África, passando pela programação televisiva e pelo efeito compulsivo-agressivo que o subsídio de natal tem no comportamento do cidadão comum. Desde os famosos gangs da noite portuense passando pelo aumentos de tudo e mais alguma coisa acima dos 2,1%, desde as reformas legislativas até ao duelo vazio e insípido do VP Valente e do MS Tavares. Este Natal aposto na abelhinha do Seingfield. É por aí.
Voltarei mais animada, agora sim, prometo.

terça-feira, novembro 27, 2007

O que é isto????!!!


Desde o principio deste mês até à segunda semana de Dezembro estou "atulhada" numa avalanche de coisas para fazer. Voltarei, nessa altura, a "escrever coisas muito muito engraçadas e muito muito interessantes"... Com esta fintei-vos não foi?

quarta-feira, outubro 31, 2007

Traidores de todo o mundo...



... uni-vos! E continuem a surpreender!


Contaram-me ontem uma rebuscada história de traição que, traduzida, daria uma novela de pico de audiência, ainda sem fim à vista. Encaixa na perfeição naquela citação do homenzinho de bigode, baixote que quis, até 1945, governar o mundo:
quanto maior é a mentira, maior a possibilidade de ser acreditada.

Na sequência disso fica aqui um útil site para os que, dessa classe, têm falta de imaginação: http://www.alibila.com/Accueil.html

terça-feira, outubro 30, 2007

Venha de lá esse frio!


Pois estou…. Quando vem ele?
Isto das alterações climáticas tem muito que se lhe diga, em três dias levou a que, pelo menos, existissem três declarações que provam uma estreita conexão entre o aquecimento global e a doença psiquiátrica:

Da Casa Branca foi declarado, como uma das justificações para a não ratificação do Protocolo de Quioto, que o aquecimento global até pode beneficiar algumas populações que anualmente sobrem baixas devido às temperaturas negativas. Isto faz-me lembrar uma crónica da semana passada do Bruno Nogueira na TSF sobre o tema na qual enunciava uma série de pontos positivos, a este nível de argumentação (só que integrados num contexto humorístico), mas, por fim, alertava para o facto de haver menos estações, o que podia lixar a vida aos estilistas! Quando a Donna Karan souber talvez pressione o Bush para que faça alguma coisa de jeito.
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A última assembleia-geral do SLB, apelidado pelos inocentes de O Glorioso: no meio de impropérios lançados pelas sancionadas claques (essa espécie que nem o raio do aquecimento global extingue!) ao Presidente Glorioso, o Vilarinho passa-se indignado, qual pai do antigo regime impondo o respeitinho, e diz que aquele senhor não é uma pessoa qualquer e por isso não podem ter aquela atitude, não o podem insultar. Eis um argumento que, se não fosse completamente estúpido, seria, digamos… elitista.
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Os jornalistas, indignados com o facto do pai da Maddie ir retomar a sua actividade de médico radiologista, após toda esta tragédia/palhaçada, arranjam de imediato um especialista, daqueles muito especiais que dizem coisas especialmente espertas, que afirmou que, como colega de profissão, acha um risco um homem daqueles, após todo o sofrimento, voltar à actividade uma vez que os seus níveis de concentração estão mais baixos. Bom, a próxima vez que forem ao médico, que estiverem no hospital para serem operados, que forem ter um filho, façam o trabalho de casa: certifiquem-se (preparem mesmo um formulário) se alguém da equipa médica que os atende teve recentemente um drama pessoal (conceito muito subjectivo, como sabemos), tipo morte de um parente, de um amigo próximo, do cão de sempre, um divórcio litigioso, um telefone sob escuta, um salto partido da bota, uma unha encravada...

segunda-feira, outubro 29, 2007

Manifesto anti-racista da comunidade ovina (ou lanígera, enfim... como acharem mais fofinho)


... ou um pretexto para que conheçam o meu pet: a ovelha Camila! Nasceu em Espanha mas veio muito pequenina para Portugal (antes que se apercebesse de tal desgraça). Vá, diz olá às meninas e meninos, e a todos os outros, que têm a coragem e, posterior, imensa satisfação de ler este blog, diz lá.................... Ouviram? É linda!

sexta-feira, outubro 26, 2007

quarta-feira, outubro 24, 2007

terça-feira, outubro 23, 2007

És tão infantil

Passava pelos bibes no caminho casa-trabalho, cantavam, pululavam de mãos dadas, a deixar cair bonés e pedacitos de felicidade da calçada. Disse-me adeus um, outro pôs a lingua de fora. Andando e pensando no elogio que me fizeram um destes dias, elogio que talvez não o fosse: disseram-me, sabe-se lá porquê, entre um molho de papéis para analisar, que o meu lado infantil era notório. Nota-se sim, cresce todos os dias, é sólido, é maduro este meu lado infantil. Já passava o Jardim Constantino quando começou a listagem, porque é preciso recolher prova, da quantidade incrível de coisas que sobram da minha infância:
  • andar de baloiço, balouçar-me quando estou triste;
  • beber água com ajuda da mão;
  • experimentar roupa dos mais velhos;
  • comer chapéus de chuva de chocolate da Regina;
  • odiar cortar o cabelo;
  • correr descalça;
  • mexer na terra com as mãos,
  • rapar as tigelas com preparado das sobremesas;
  • distrair-me a seguir carreiros de formigas;
  • chapinhar em qualquer poça de água;
  • separar os vários tipos de comida no prato;
  • resmungar para dentro quando me ofendem "Se sou(... enfim a ofensa) e tenho fama é mais (... a mesma ofensa) quem me chama".
  • beber sumol de ananás;
  • falar e cantarolar quando estou sozinha;
  • andar de bicicleta sem ter em mente o fitness,
  • fazer origami, um bocadinho mais complexo, pronto;
  • pensar que qualquer coisa vai acontecer se aquele sinal não cair a tempo,
  • ...

Lista interminável concluí. Entretanto chego ao trabalho, já no elevador, depois de uns bons dias diplomáticos, constato de novo que preferiria sempre, pela manhã, a escola primária.

segunda-feira, outubro 22, 2007

Esclarecimento


"Quem ri por último, nem sempre ri melhor. Às vezes só não entendeu a piada."
Jô Soares

segunda-feira, outubro 15, 2007

No dia em que ganhar o Nobel

A Doris Lessing

Nesse dia já terei passado tanto que o meu cabelo desistiu de toda a cor, que a minha pele secou, já terei visto o suficiente para manter o brilho no olhar, para, num ápice, distinguir, certeira, o essencial do acessório. Então virei das compras como em qualquer outra manhã, virei de comprar coisas, o prosaico da vida, pão, iogurtes, é doce a fruta não é, arranje-me aí um pargo bem fresco, especiarias, flores, sempre flores. Dizia, virei das compras, regresso à minha casa, discreta, bonita, bem cuidada, talvez já vazia, com um jardim onde me demoro nos gatos e nas roseiras, e aí estavam eles, acotovelam-se, às dezenas, sem face, objectivas e microfones em burburinho sintético. Do táxi assusto-me, não reconheço a minha rua, a minha casa. Que quererão? Alguma catástrofe, alguma estrela com um escândalo? Só os vejo a eles. Flashes pela manhã, virão direitos a mim, cercam o seu alvo. Perguntarei atónita, naquela invasão inusitada do meu mundo, o que fotografam? Porque estão aqui? E eles, saboreando a notícia em primeira mão, engasgados de audiências dirão ganhou o Nobel daLiteratura! Penso devagarinho N-O-B-E-L-D-A-L-I-T-E-R-A-T-U-R-A-G-A-N-H-E-I. Vejo-me na infância, tomo-me conta, como sempre, junto ao mar depois de uma tempestade. Uno ponto por ponto todos os momentos felizes, foram tantos, não tinha dado conta, relevo todas as dores que os provocaram. Pouso os sacos das compras. Não respiro e digo Meu Deus como se nele acreditasse, chamando-o para que venha testemunhar a bizarria, o inédito do momento. Meu Deus! Retomo o fôlego para todo o reconhecimento do mundo que nunca de mim tinha ouvido falar, entro em casa, acondiciono o peixe, a fruta e os vegetais, sento-me no sofá, olho pela janela entreaberta. Eles esperam-me para todos os discursos inteligentes. Eu aqui, ainda invocando o Seu Santo Nome, desta feita não em vão, eu aqui, um Nobel da Literatura, gelada, suspensa, feliz, um Nobel da Literatura e sem, pela primeira vez, uma única palavra.

quarta-feira, outubro 10, 2007

A pura ficção (com todas as semelhanças com a realidade) do amor contemporâneo

...
Bem. Cansada mas bem. E tu?
Bem, cansado. Muito. Mas acabei de regressar de férias.
Então e mais coisas?
Todas as coisas! Jantamos um dia destes?
Pode ser... fazes o agendamento?
Começamos pela tua enciclopédia (ainda estás a escrevê-la, não é?) a do universo masculino português e depois...
Não, desisti ... converti-a numa tira de bd... cómica!
Fico contente por, de alguma forma, ter contribuído para tamanha conclusão.
És uma cobaia simpática. Mas a conclusão não se baseia em ninguém em especial, é um saber cumulado, muitos testemunhos, muita observação.
Pois, esse humor cínico-alternativo!
Em plena forma!
Bom, contigo não há agendamento possível. Retomamos então naquele almoço com vista para o rio?
O quê, o do dia em que nos conhecemos?
Sim. Mas podem ser os outros, foram todos perfeitos!
Estás bem? Contraíste algum vírus tendencialmente incapacitante?
Não achas que oito anos de assunto preenchem uma agenda?
De quantos jantares?
Bem sabes que são os que quiseres.
Contraíste o tal vírus de facto. Não te consigo levar a sério!
Por isso é que tens graça!
...
(continua...)

segunda-feira, outubro 08, 2007

Esse imenso Outono


Depois de ter feito a bela noitada a escrever a tese, que quanto mais páginas tem mais páginas precisa ter, acordei cedo e rumei à Ericeira porque o meu único sobrinho fazia um ano e ansiava pelos canapés que a Tia Ouriça ia fazer para os convidados.(Está lindo o meu sobrinho que adora os meus mimos misturados com os meus colares gigantes!) Ao lanche fomos invadidos pelos trinta mil convidados e as suas respectivas crianças (as estimativas oficiais apontaram para mais do dobro dos convidados adultos) que animaram a casa, o condomínio, o bairro, enfim, toda a região oeste, com as suas brincadeiras mais ou menos incompreensíveis para as quais tenho uma infinita paciência. Quando já não precisavam que fizesse de “grande”, refugiei-me na varanda para falar de futebol e de política com alguns homens que se tinham refugiado, por sua vez, da restante família. Quando suspeitei que as considerações acerca do universo feminino se iriam iniciar, engoli um café, uma fatia de bolo e uma taça de um belo champanhe num ápice e fugi para a praia do Sul, naquele fim de tarde, ainda a tempo de ver o pôr do sol. Bem sei que é mais ou menos igual há vários milhões de anos, porém a novidade não me empurra necessariamente para a felicidade. Assim, embrulhada na toalha de verão e de botas espalhadas na areia, fiquei ali distraída, sem pensar em nada, eu, o mar, o que restava do sol e dos surfistas do dia, a saborear esse imenso Outono que era aquela praia.

terça-feira, outubro 02, 2007

Pensamentos, constatações e outros devaneios


Pensamentos que me assolaram e episódios bizarros da semana passada:

Finalmente o Santana Lopes disse alguma coisa de jeito (só direi isto uma única vez), passo a citar”Oh minha senhora o país está doido!”

Vi a reportagem na SIC sobre os monges da Cartuxa, “O elogio da solidão”, e surpreendentemente, confesso, fiquei com muita pena de não ter nascido com aquela vocação quase eremita que lhes dá tanta felicidade;

Que o Plano Tecnológico deve dar um novo passo (e rápido) para dotar equipas de árbitros do futebol da 1ª Liga de tecnologia de ponta, infalível para que a comunicação nunca falhe (Se o Santana ainda fosse Primeiro Ministro (arghhh!!!) era para ontem!);

Que a chuva de Outono (que saudades!) sabe bem, tão bem em casa com janelas grandes, de sofá, almofadas, Expresso e uns cubinhos de chocolate.

No domingo pela manhã enfiei-me num famoso Centro Comercial para resolver as trinta coisas que tinho deixado acumular nos últimos tempos. Fiquei deprimida: numa uma hora e meia presenciei três discussões audíveis, duras, de casais desavindos, uma das quais ao telefone, pelos seguintes motivos:
- a Sandra (do outro lado do telefone) foi sair com o Não-Sei-Quantos que provocou uma fúria gigantesca no Não-Sei-Quantos II, por enquanto o seu namorado oficial;
- Um casal discutia numa sapataria. A filha chorava de birra. Motivo: as botas que a menina gostava estavam esgotadas e o pai arranjou outras como alternativa melhores, mais funcionais e igualmente caras. A mãe achava inadmissível levar umas botas contra a vontade da filha. O tom da discussão cresceu ao ritmo do choro da criança.
- O terceiro Não-Sei-Quantos dizia, repetidamente e num tom descontrolado, à mulher amuada, que fingia ignorá-lo enquanto via expositores de cds, para não estar armada em parva, que já o conhecia e era assim e pronto (seja lá o que “era assim” fosse).
Saí deprimida, com vontade de ficar solteira para o resto de toda a minha sã vida e a pensar naquela sábia frase (nunca pensei dizer isto) do Santana Lopes. Irra!

terça-feira, setembro 25, 2007

Ode a um amor perfeito

Queria dar-te. Quase tudo. Carinho, frases, lugares que desconheces mas que já gostas, presentes de criança… Queria dar-me porque sei que sabes receber, tiras o papel com cuidado e guardas-me aí dentro como se de um precioso tesouro se tratasse.
Queria desenhar em nós horas que são sonhos, sorrisos que são “estórias” de encantar e mãos que têm na ponta dos dedos dias de sol ou de chuva.
Queria que me adivinhasses em cada gesto e que deixasses escrever-te em cada linha.
Queria que morasses em mim como a esperança de encontrar quem me sabe de cor. Queria, por fim, depois da tempestade, ter a coragem de não fazer a mala à pressa e partir, de ficar e dar-te os meus livros, os meus filmes, as minhas memórias, os meus amigos… de ficar a embalar todas as tuas dores e alegrias, adormeceres nos meus braços e eu adormecer-me em ti.

sexta-feira, setembro 21, 2007

Poesia matinal

Tenho o saudável hábito de todas as manhãs, durante a semana, ouvir, quase quase em cima das nove, “Os Sinais” do Fernando Alves na TSF. Ouço-o por tudo, pela preocupação com o mundo, pela voz, pela sensibilidade, com a qual me identifico, e sobretudo porque, quando for grande, gostava muito de escrever como ele. Hoje narrava Fernando a história de um pobre camponês na Baía, Brasil que se deslocara ao Planalto, andando quatro dias sem comer, para que Lula o socorresse da falta de tudo a que sempre fora vetado. Do tudo que seria, para muitos de nós, tão pouca coisa: uns trocados, cuidados de saude, carinho. É esta poesia, uma vezes doce outras cortante, demolidora mas sempre real, é esta pureza matinal que me faz sair de casa, enfrentar uma cidade barulhenta, um dia agitado com um sorriso imenso na alma.

segunda-feira, setembro 17, 2007

Estou na minha fase de indignação (já passa...).


Sócrates está nos EUA. Vai ser recebido uma hora pelo Presidente Bush: 55 minutos na qualidade de líder da Presidência da U.E., 5 minutos na qualidade de Primeiro Ministro de Portugal.

Dirá que Bush é bem vindo a Portugal. Ele que venha. Qualquer grupo terrorista (com métodos não suicidas) informado saberá que aqui compensa fazer um atentado como deve de ser: a coordenação policial apadrinha, o novo Código do Processo Penal abençoa.

quinta-feira, setembro 13, 2007

David


Sobre ele não sei muito. Sei sobre o que defende e porque defende. Leio com atenção desde alguns anos o que diz pelo mundo. Ontem, quando um jornalista lhe perguntava porque tinha vindo a Portugal ele respondeu, como se estivesse a falar com um amigo de sempre, longe de qualquer máquina de marketing, que lhe enviaram dinheiro para a viagem e por essa razão ali estava. Tipo fixe, pensei. Sem preconceito de falar no material, sem discursos elaborados sobre os Direitos Humanos (de quem todos falam mas que poucos vêem) dizendo o que lhe dá na real gana, borrifando-se para os Golias que o esperam em quase todo o lado. Respeito-lhe a “Sua Santidade” porque me parece mesmo um tipo sábio, muito sábio... e fixe.

segunda-feira, setembro 10, 2007

o escritor


Acabei de ver o Lobo Antunes. Entrou e sentou-se quase a meu lado. Partilhámos uma refeição. Senti-o respirar. Apoiou-se na cabeça várias vezes enquanto lia os jornais. Pesa-lhe o mundo. Pesam-lhe as memórias da guerra e todas as outras sobre as quais insistiu escrever. Está cansado o escritor. Está cansado de estar doente, do mundo estar doente, desse estado cosmicamente doentio. Está triste o escritor. Faltam-lhe aquelas palavras que não consegue encontrar, no meio de tantas outras, para o seu, teme, derradeiro livro. Sobreviveu a quase tudo, ao privilégio e à dureza, tem dúvidas se sobrevive a si. Indigna-se como o mundo contínua se, ali dentro, tudo está suspenso, pelo medo, pela incerteza. Tenta compensar o fim fictício do tabaco com mais jornais mas, malogrado esforço, não se consegue esquecer de si. Olha-me de soslaio, meio curioso, totalmente arrogante como lhe é característico. Mede-me para saber se caibo em alguma história, se sou parecida com alguma personagem. Pergunta-me se fumo. Finjo distracção e digo-lhe que não. Não me ajusto à sua narrativa concluiu. Mergulha de novo no mundo e em si e eu acarinho-o com o olhar enquanto pago a conta. O escritor retomou-se.

sexta-feira, setembro 07, 2007

Búzio


sei que nunca viste o oceano,
que nunca olhaste a onda sobre a onda,
que nunca fizeste castelos para o mar ser forte.

mas sei que já viste o coração das coisas,
que já tocaste a ferida nos nossos braços,
que já escreveste para sempre o nome da terra.

por isso te digo que vou levar-te o mar
na concha das minhas mãos, azulíssimo,
para que nele descubras o meu nome
entre os seixos os búzios os rostos que já tive.



Vasco Gato, Um Mover de Mão

quarta-feira, setembro 05, 2007

Humor islandês (leia-se o meu!) ou um brevissimo tratado sobre a proporcionalidade


Numa esplanada numa destas noites de Verão alguém se saiu com esta:


Um anão chega a casa cansado no fim de um dia extenuante de trabalho.

A sua mulher, anã, meio indignada meio enojada diz-lhe:

Eh homem! Vai-te lavar... cheiras a pónei!

segunda-feira, setembro 03, 2007

Puente

Passava eu, neste fim-de-semana, vinda de Espanha, a fronteira do Caia quando me deparo com a placa que dá nome à, quase imperceptível, ponte internacional sobre o rio Caia: Puente José Saramago. Fiquei surpreendida, confesso. O que nos une a Espanha afinal? Paralelismos com o PIB e com políticas sociais não são: Espanha acelerou há muito tempo rumo ao crescimento económico, com “superávits” pelo meio. A monarquia não os impediu de terem políticas progressistas ajustadas à realidade, não os impediu de colonizarem de novo o mundo, o mundo do consumo, mas o mundo. A cultura também não é: Espanha vibra, sem precisar de Berardos, absorvendo passado e presente, atenta à diversidade que também define a arte. O orgulho também não: exacerbado, por vezes, os espanhóis amam o seu país, dão-no a conhecer ao mundo apesar de todas as divisões.
Sempre olhei para a fronteira com desconfiança porque acredito no bom senso popular e porque, como gosto muito de História, sei bem o que tivemos de fazer para existirmos enquanto país. A língua irrita-me ligeiramente. A comida faz-me azia. Nem dos caramelos com pinhão gosto muito.Mas estava eu a passar a puente Saramago para Portugal e lembrei-me da “Jangada de Pedra” que não tinha ponte nenhuma para o resto da Europa, navegava isolada em pleno Atlântico.”Vejo a Ibéria como a criação de um país novo” ecoa a entrevista ao Expresso desta semana. Não sei se por amor, por insanidade, por vingança política ou por tardia convicção. Lutou à sua maneira pela liberdade, escreveu, escreveu, escreveu, nesse escrever criou novas regras de pontuação, deu-nos o Nobel, deu-nos com os pés quando trocou o sol de Lisboa pelas cinzas de Lanzarote, deu-nos a puente e, por causa dela, talvez se tenha esquecido de quem realmente somos.

terça-feira, agosto 07, 2007

Como sou desastrada...



Tenta outra vez.
Falha outra vez.
Falha melhor.

Samuel Beckett

sexta-feira, julho 27, 2007

Poema em forma de delta

há rios
que são navegáveis
e navegam. é desses que eu gosto.



Jorge de Sousa Braga

terça-feira, julho 24, 2007

A subjectividade do Romantismo


Num dia destes numa daquelas revistas cor de rosa, sempre tão hilariantes, vinha uma reportagem de umas quantas páginas sobre um casamento de famosos-muito-pouco-quase-nada-famosos. Além das discutíveis opções estéticas do vestido e do fato dos ditos a peça jornalística frisava que nas alianças, da marca que-nunca-ouvi-falar, estava inscrito a seguinte frase romântica:

Agarra-te aos meus lábios

Não sei se pelo excesso de trabalho ou pelos dias de chuva ou pela falta de um resort caribenho achei que a frase tinha um toque quase nada romântico. Podia ser perfeitamente um

Pendura-te no meu coração (o que daria uma certa sensação de pendura);
Estatela-te no meu olhar(mau porque podia magoar alguém);
Tropeça nas minhas orelhas (dependendo das ditas a queda podia ser grande);
Equilibra-te na minha bochecha fofinha ( um bocadinho egocêntrico e visualmente desagradável);
Escorrega na curva do meu queixo (radical no caso do chamado queixinho de bruxa);
Apanha banhos de sol na minha testa (bom, agora no verão).


É assim o Romantismo... às vezes custa muito percebê-lo quando vem publicado em pormenores, desapaixonadamente, quase sem querer, a bold, destaque quatro páginas.

quarta-feira, julho 18, 2007

Conversar sobre o tempo...



... que geralmente é o que se faz quando não há assunto. Não se preocupem. Eu tenho sempre assunto, hoje apetece-me mesmo é falar sobre o raio do tempo que não me tem deixado ir à praia como deve de ser! Se continuar assim vou passar o resto do Verão com o casaquito na mala e com o guarda chuva na cabeça! Parece que continuo, metereologicamente falando, nos Açores! (desculpem este post da treta mas isto anda-me MESMO a irritar!).

quinta-feira, julho 12, 2007

Nostalgia kitch


Lembro-me dos meus dias pavorosos de República Dominicana há alguns anos atrás: resort kitch supostamente integrado na “vegetação luxuriante” que se estende até ao mar, bebidas na piscina-bar (consistia num balcão e respectivos bancos fixos enfiados na dita) a partir das 11 da manhã, das aulas ensurdecedoras de qualquer coisa entre aeróbica e dança latino americana, das multi-actividades “estimulantes” como curso de mergulho numa piscina mínima ou o cortar as ondas (que não existiam) numa espécie de barco igual a uma banana gigante. Lembro-me ainda da lagosta com batatas fritas (argh!!!!!), dos gigolôs indígenas em tanga reduzida que acompanhavam as turistas do primeiro mundo já em plena decadência física mas no auge do vigor financeiro, da discoteca do caribe que estimulava ao absoluto ridículo. Lembro-me dos banhos às 07.00h da manhã na piscina junto ao bungalow quando todos dormiam e da areia meia escura, fria nos pés ainda do orvalho da noite. Lembro-me das milhentas bebidas afrodisíacas locais, que não tínhamos coragem de provar (vide episódio dos gigolôs), do amargo do cacau e da cascata virgem, em plena selva, enquadrada por um guia armado em D. Juan. Lembro-me de tudo isto e dou por mim, inacreditavelmente, a ter saudades.

quinta-feira, julho 05, 2007

Falta assim um bocadinho....


... para fazer um click. Desisto. Resolvia-se com uma sesta ao som do mar. Há dias (comprovadamente HOJE) assim!

Este post não é feminista! (mas também não é feminino)



Devido aos milhentos contactos que tenho feito ultimamente, a propósito da Presidência Portuguesa da U.E, ando agradavelmente surpreendida com a quantidade de mulheres que andam por aí a ocupar, nas mais variadas instituições, lugares de relevo. Não sou a favor das quotas e similares, que fique claro, acho isso uma perversão da selecção natural. Contudo há uns anos atrás continuavam a sair aos magotes das faculdades mas (tirando para aí a Tatcher na vertente política mundial e a Padeira de Aljubarrota na vertente história de Portugal/ reality show medieval) as mulheres que ocupavam desde sempre os postos mais elevados eram as hospedeiras (seriamente ameaçadas pelos concorrentes comissários de bordo meios apaneleirados)!

quarta-feira, julho 04, 2007

Happy Family (vide só três primeiros dedos a contar da esquerda)


O patriarca (o do sorriso) acordou, na semana passada, numa cama diferente rodeado de pessoas com o dom da cura. Uma semana depois o tal do dom funcionou (ainda que mais ou menos). Agora acorda na cama de sempre, com o sorriso quase quase igual ao de sempre. É assim a Happy Family, um bocadinho menos Happy, por vezes, mas cada vez mais Family.

segunda-feira, julho 02, 2007

Todos iguais


Por causa de toda esta história que o senhor do blog contou sobre licenciaturas, pelos vistos e lidos, ilusórias, do senhor da DREN bem humorado ou do médico de um centro de saúde do país real que resolve afixar no placard uma noticia peculiar que citava o seu ministro, dizia, por causa de tudo isto e muito mais parece que temos de conter a língua, o riso, o livre pensamento... parece que temos todos de ser... iguais a eles. Arghhhhhhh!

quarta-feira, maio 30, 2007

Esta imensa liberdade.


Esvaziei as gavetas. Arrumei meticulosamente os restos que ficaram em cima da secretária. Recarreguei o agrafador, esvaziei o depósito do furador. Doei tudo o que sempre fez falta nestes últimos seis anos. Gravei todos os meus ficheiros. Desfiz expectativas, refiz um caixote de tralha e esperança. Risco o 30 no calendário e perco-me em todos os outros dias por riscar. Desliguei o ar condicionado e abri a janela para arejar aquele lugar. Apaguei a luz e saí. No elevador, dou por mim a tentar lembrar cores e formas como se dali tivesse saído há anos. Surpreendo-me com o que já esqueci.Vou para casa a pé. Pelo caminho tento arrumar cá dentro toda esta imensa liberdade.

domingo, maio 20, 2007

Sobre a felicidade...


... li hoje, a temática principal da revista do "Espresso" ao qual sou fielmente critica.


O Vinicius de Moraes disse, citando a minha felicidade, que


"É preciso que haja alguma coisa de flor em tudo ".

A felicidade aprende-se, escolhe-se, descobre-se, quer-se. Não tem formulas, tem formas. A minha não é a das personagens daqueles clássicos do cinema de final feliz, onde se conquistam todos os territórios, onde se guardam para sempre os grandes amores, onde os sonhos mais fantásticos se tornam reais. A minha felicidade é pequenina, é a de todos os dias, trago às vezes na mão, na mala, nos olhos. Por vezes esqueço-me dela em qualquer lugar e fico angustiada enquanto não a encontro. Por vezes sei onde está, dou-lhe só o tempo que precisa para se arranjar, não me importo de esperar. Por vezes é ela que me espera mesmo no fim das decisões acertadas, a meio dos incríveis desaires. A minha felicidade é livre de florescer quando bem lhe apetecer, cuido para que não murche ou seque ou sufoque.

Promessas, promessas...

Estou a mudar de emprego, de trabalho, mais trabalho, menos emprego, estou a escrever a tese, estou com pequenas obras em casa, estou lisa, estou ansiosa, estou sem tempo, estou a aproveitar mal o tempo, estou a tentar ter tempo para mim, estou a ganhar fôlego, estou a sedentarizar o corpo e a exercitar a mente, estou a tentar fazer o meio contrário, estou à espera, estou em pleno 2007 ano onde acontece quase tudo. Estou cansada. Estou feliz. Estou em estado de choque quando... penso nas minhas férias (só em Dezembro)!

sexta-feira, abril 27, 2007

Sem palavras (mas com algumas, esclarecedoras, letras...)

Porque, sobre este assunto, não há mesmo muito mais a dizer...

Enfim sós!


Tropeço na solidão todos os dias. Várias vezes por dia. Não propriamente na minha. Tropeço na solidão da globalização. Nesta mega solidão grupal do anonimato, a do reflexo ténue no ecrã do computador, do i-pod, do telemóvel. Conquistámos o mundo, construímos o conceito de bem-estar. Criámos direitos fundamentais, cartas e acordos e protocolos internacionais recheados de direitos fundamentais. Consolidámos o bom senso. Mergulhámos na tecnologia, em formas limadas de cultura, teorizámos toda a política. Dissecámos todas as Eras da História. Há quem tenha mesmo declarado o seu fim. Descobrimos o Universo. Perdemo-nos uns dos outros. Achámos a solidão. Definitivamente.

Deixo aqui o meu poema preferido do Herberto Hélder. Para quem sabe que a solidão tem limites. Bem definidos.


Não sei como dizer-te que a minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e casta.

Não sei o que quer dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. Quando,
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima
_eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim te procuram.

Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros
ao lado do espaço
e o coração é uma semente inventada
em seu ascético escuro e em turbilhão de um dia
tu arrebatas os caminhos da minha solidão
como se toda a minha cara ardesse pousada na noite.

E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.

Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes se despenham no meio do tempo
_ não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.

Herberto Hélder

segunda-feira, abril 23, 2007

O dia do livro é quando um(a) gaja(o) quiser!!!


Não consigo escolher o favorito… Lembro-me de muitos desde “Anita vai à escola” até às “Memórias de Adriano” da M. Yourcenar. Há a prosa pura que me entretém e me faz esquecer de quem sou. Há os contos que me surpreendem e a poesia que me faz sentir viva. Há os eruditos e os despretensiosos. Há os dramáticos e os bem humorados da primeira à última frase. Há os épicos, os históricos e os que contam o que se passa aqui dentro como se da maior epopeia se tratasse. Lembro-me ainda do “Livro do Desassossego”, do “Monte dos Vendavais”, da “Poesia Toda” do H. Hélder, do “Sangue do meu sangue”, da “Crónica dos bons malandros”, de “Os Maias”… Lembro-me de todos, tantos… que me interrogo com frequência como os guardo a todos, aqui, na minha mão.

sábado, abril 14, 2007

Ainda demora muito?


Pacientemente esperando que esta impaciência passe...

Pérola pela manhã.


Distraio-me a observar as pessoas frequentemente. Mais por feitio que por vício ou pelos ossos do ofício. A diversidade humana é imensa. Hoje, para compensar um sábado de trabalho, fui ali à leitaria beber um café para acordar, comer um queque queimado e fingir que lia devagarinho o Expresso. Estar naquela mesa do cantinho é uma experiência a não perder. Costumo ter, quase a meu lado, o Pedro Mexia, sempre com três a quatro livros e com a cara enterrada, literalmente, num qualquer Diário. Suspeito que tenta disfarçar da mesma maneira que eu. Além das criancinhas traquinas e de alguns velhotes bem dispostos há sempre algumas novidades: ou as meninas de uma disco das imediações reforçando energias, aprontando-se para dormirem até à hora de jantar, um ou dois colegas entediados com os programas da manhã que passam no ecrã fora de moda, um cão à porta que espera impaciente o dono que demora a engolir o rissol e o café, um amor a começar entre duas chávenas, um copo de água e pequenas confidências. Depois começo a ouvir as conversas. Banais, interessantes. Revejo-me ou entedio-me. Sorrio. Na mesa em frente estava o chamado “pintas” a contar ao amigo como trata a nova e submissa namorada. O conteúdo desprezei. Tropecei na forma. Ele dizia muitas vezes que “quando lhe dava na vinheta” fazia isto ou aquilo. Tenho uma colecção mental destas expressões trocadas que revelam a descontracção dos portugueses com a sua língua, que revelam o seu absoluto alheamento do sentido de algumas expressões. Esta quase que bateu a do “bode respiratório”. Quase.

quarta-feira, março 21, 2007

Porque começou a Primavera no dia em que se comemora a Poesia



A Erva da Fortuna

A erva da fortuna cresce como por encanto nas orelhas dos políticos,
o primeiro ministro proclama a amnistia para os cucos dos relógios,
o degelo nas relações internacionais restabelece o nível das águas nas albufeiras, o ministro da energia esfrega as mãos de contente.

Embora o boletim meteorológico seja controlado pelo governoo, nuvens cor de chumbo toldam frequentemente o horizonte,
os pescadores de águas turvas procuram o alto mar,
uma chuva de impostos cai de imprevisto
ah a chuva na Primavera, escrevem os poetas.

As andorinhas podem passar livremente a fronteira.
Os polícias oferecem grinaldas aos condutores de veículos mal estacionados.
O cio invade a assembleia. Os deputados bombardeiam-se com pólen.
Um nostálgico do Outono argumenta: a Primavera de Praga também foi de lagartas nas estradas.


Jorge Sousa Braga

O Poeta Nu

Fenda

Ainda...


... a aterrar. A adaptação à vida de sempre é mais difícil que o imaginado. Estou em reconstrução. Com um sorriso imenso mas... vazia, vazia.
Até (muito) breve.

terça-feira, fevereiro 27, 2007

o que mudou e o que não mudou


Regresso definitivamente a Lisboa na sexta dia 2. Nem estou ainda a acreditar. Embora vá lá uma vez por mês sinto, agora no regresso, que chego a uma cidade um pouco mudada. Há mais uma ou outra radial, mais um ou outro centro comercial, pode-se falar ao telemóvel no metro, a programação dos centros de cultura está cada vez pior, o Saldanha está um caos, há túneis a postos para serem inaugurados (talvez antes das eleições antecipadas), há tapumes a retirar e a colocar em outro lado, aleatoriamente, há outros percursos, há, por fim, uma casa restaurada para chegar ao fim do dia.
Sei que eu chego também diferente, com as mesmas manias e teimosias, com mais cabelos brancos, mais remendos e muitos sorrisos, de alguns que por aqui encontrei, guardados nas duas imensas malas. Dois anos foram um ápice de felicidade e de problemas, de dificuldades e de golpes de sorte, de radicais afastamentos e de surpreendentes aproximações, de esforço intenso e de preguiça acumulada ao sol num destes prados verdes. Levo numa mão este mar intenso, imenso, indomável e na outra o optimismo e a esperança de sempre.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

A dificil arte de escrever alguma coisa que preste

Ando stressada com, mais uma vez, as mudanças da minha vida. Ainda não sei qual o dia desta semana que me deixam voltar definitivamente a Lisboa. Entretanto devido às despedidas, às insónias, aos projectos do futuro imediato e aos pensamentos perdidos não consigo escrever nada que preste. As sinapses não estão a ser feitas devidamente suspeito...

terça-feira, fevereiro 20, 2007

Eusoutuetueu












Lia ontem, na livraria do costume, esta pequena história cheia de sabedoria oriental. Fala sobre a dificuldade que todos temos de sair de nós e encontrar o outro e sermos, nessa árdua tarefa, correspondidos. Talvez por isso vivemos na era da solidão.

Numa aldeia da China profunda um jovem enamorado resolve ir visitar a sua amada que sabe que o corresponda naquele amor. Assim, chega a casa dela e bate à porta.
Quem é ? – pergunta a jovem.
Sou eu. – responde o jovem enamorado.
Ela entristece-se com a resposta e pede-lhe que vá meditar sobre ela para a floresta.
O amor tem destas coisas e o jovem lá foi meio baralhado e triste por ter de alguma forma magoado a sua amada.
Uns meses depois sentiu-se preparado, voltou a bater-lhe à porta.
Quem é? – pergunta a jovem.
Sou tu – responde o jovem enamorado sabiamente.

E por isso vos digo, à boa maneira ocidental, que viveram felizes para sempre.

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Depois de dizer sim

O Sim ganhou por minha culpa e por culpa de quem se mobilizou para prencher o mesmo quadradinho. Nada contra os argumentos (os sérios) do Não. Mas tudo a favor dos do Sim. Depois desta discussão, a qual passou ao largo da maioria dos portugueses, preocupados em pagar dividas, arranjar emprego e hora de consulta no médico de família, importa fazer alguma coisa de jeito, para variar, sobre o planeamento familiar e a educação sexual neste país, as questões cruciais que nos levam a discutir horas a fio outras que se limitam a ser a sua consequência. Afinal somos oficialmente um país civilizado, laico, do primeiro mundo, membro da UE. Oficialmente.

sábado, fevereiro 17, 2007

Sonhar (quase) acordada


Desde há duas semanas que ando a sonhar que estou grávida. Não estou. Nunca estive. Gostaria, daqui a uns tempos. Hoje, finalmente tive a criança sem dor (viva!), só com ansiedade. Dada a insistência deste sonho tentei desvendar o seu significado além do básico que a Psicologia adianta e que não se encaixa aqui: sonhamos com o que muito tememos ou com o que muito desejamos. E saiu isto:

Gravidez: Feliz aumento de bens, eis o presságio para uma mulher que sonhou com gravidez; homem sonhar com gravidez é aviso para que não se exponha, não cometa excessos.
Parto: Se, em sonho, você assistiu a um parto, saiba que brevemente terá a ajuda de pessoa amiga. Você ou outra pessoa em trabalho de parto é prenúncio de que participará de uma óptima companhia e projetos serão levados a cabo.


E não é que é?! Em 2007 vou ser uma rapariga mais esotérica. Acompanham-me? Não me parece...

As palavras dos outros no meu regresso

A Máquina Fotográfica

É na câmara escura dos teus olhos
que se revela a água
água imagem
água nítida e fixa
água paisagem
boa nariz cabelos e cintura
terra sem nome
rosto sem figura
água móvel nos rios
parada nos retratos
água escorrida e pura
água viagem trânsito hiato.

Chego de longe. Venho em férias. Estou cansado.
Já suei o suor de oito séculos de mar
o tempo de onze meses de ordenado;
por isso, meu amor, viajo a nado
não por ser português mal empregado
mas por sofrer dos pés
e estar desidratado.

Chego. Mudo de fato. Calço a idade
que melhor quadra à minha solidão
e saio a procurar-te na cidade
contrastada violenta negativa
tu única sombra murmurada
única rua mal iluminada
única imagem desfocada e viva.

Moras aonde eu sei.
É na distância
onde chego de táxi.
Sou turista
com trinta e seis hipóteses no rolo;
venho ao teu miradoiro ver a vista
trago a minha tristeza a tiracolo.

Enquadro-te regulo-te disparo-te
revelo-te retoco-te repito-te
compro um frasco de tédio e um aparo
nas tuas costas ponho uma estampilha
e escrevo aos meus amigos que estão longe
charmant pays
the sun is shining
love.

Emendo-te rasuro-te preencho-te
assino-te destino-te comando-te
és o lugar concreto onde procuro
a noite de passagem o abrigo seguro
a hora de acordar que se diz ao porteiro
o tempo que não segue o tempo em que não duro
senão um dia inteiro.

Invento-te desbravo-te desvendo-te
surges letra por letra, película sonora,
do sendo à vogal do tema à consoante
sem presença no espaço sem diferença na hora.
És a rota da Índia o sarcasmo do vento
a cãibra do gajeiro o erro do sextante
o acaso a maré o mapa a descoberta
dum novo continente itinerante.



José Carlos Ary dos Santos
Obra Poética
Lisboa, Edições Avante, 1994