Voltei a ser um homo pedestrus. Contudo, há dias de preguiça ou de saltos altos em que o amarelo da carris me encanta de forma particular.
Sento-me quase no início, de costas para o rumo a seguir, observando todo o autocarro. Estranho o som que nasce na cabine do motorista, uma playlist de musica pimba portuguesa e francesa acompanhada pela sua voz de tenor do bairro. De pronúncia irrepreensível, interrompida pelos bons dias que insistia em dar aos novos passageiros, ele declarava desfeito ou esperançoso – não consegui descortinar – je t’aime mon amour, je t’aime(eeeeeeeeeeeeeeeeee). De seguida adiantava-se numa letra do Tony Carreira, nunca se desconcentrando pela emoção da curva apertada, pela adrenalina do semáforo amarelo, pela surpresa da paragem. O meu motorista da carris, tenor do bairro, óculos escuros, cabelo rapado, melou todo um autocarro matinal, cinzento de contrariedade e de sono, com o seu romantismo lânguido. Quase de saída ainda ouvi, convicta e afinadamente, pedir para um amor desavindo voltar e perdoá-lo. Talento puro.
Ocorreu-me escrever à Carris louvando-o pela alegria ( e surrealismo, vá) que coloca no seu trabalho mas, dado o gosto musical duvidoso, abandonei de imediato a ideia .
2 comentários:
Eheheh!
Jinhos.
adoro a atenção que tens aos pequenos pormenores logo pela manhã
Enviar um comentário