Apetecia-me escrever sobre a canção de intervenção em Portugal e o seu efeito (in?)útil. Apetecia-me escrever sobre o tempo que não tenho, a motivação que não tenho ou, dependendo, sobre o tempo que me sobra e o entusiasmo que me sufoca. Apetecia-me escrever sobre a ciência de dizer palavrões articuladamente ou sobre o facto de, hoje em dia, haver uma campanha subliminar do politicamente correcto para a higienização da língua portuguesa. Escrever sobre as viagens que fiz mas, sobretudo, sobre as que não fiz e que já não cabem dentro de mim. Apetecia-me dissertar sobre a esperança, relatar as presenças mais entusiasmantes num festival literário, dizer mal e bem dos últimos filmes ou livros vistos e lidos. Apetecia-me moldar o amor em palavras, elogiar a democratização que resulta do low cost ou deleitar-me com o luxo dos pormenores que diferenciam. Enunciar as qualidades de um dia de sol ou lamentar os defeitos da humanidade urbana e mediocre que povoa os dias. Apetecia-me ironizar com os quotidianos pontapés na gramática ou sugerir aquele restaurante italiano onde fui, um destes dias, pela primeira vez. Mas, infelizmente, deparei-me com o meu recibo de vencimento deste mês e, pronto, lá emigraram para longe palavras e inspiração.
2 comentários:
#*!@/, §!!*"@#, %!§?+*!!
Criptorquídeo Roncolhoso!
Babuíno descabelado!
E outros impropérios dignos de Capitão Haddock foi o que disse quando vi o meu :(
Sem querer ser uma boba otimista e nem de longe achar que valha a pena tal absurdo de recibo de vencimentos, não posso deixar de assinalar que não vi ainda melhor proveito reativo que esse belo texto, que desfaz completamente a emigração das palavras e da inspiração...cá estão elas, aprendendo o caminho de volta, obrigada!
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