segunda-feira, setembro 03, 2007

Puente

Passava eu, neste fim-de-semana, vinda de Espanha, a fronteira do Caia quando me deparo com a placa que dá nome à, quase imperceptível, ponte internacional sobre o rio Caia: Puente José Saramago. Fiquei surpreendida, confesso. O que nos une a Espanha afinal? Paralelismos com o PIB e com políticas sociais não são: Espanha acelerou há muito tempo rumo ao crescimento económico, com “superávits” pelo meio. A monarquia não os impediu de terem políticas progressistas ajustadas à realidade, não os impediu de colonizarem de novo o mundo, o mundo do consumo, mas o mundo. A cultura também não é: Espanha vibra, sem precisar de Berardos, absorvendo passado e presente, atenta à diversidade que também define a arte. O orgulho também não: exacerbado, por vezes, os espanhóis amam o seu país, dão-no a conhecer ao mundo apesar de todas as divisões.
Sempre olhei para a fronteira com desconfiança porque acredito no bom senso popular e porque, como gosto muito de História, sei bem o que tivemos de fazer para existirmos enquanto país. A língua irrita-me ligeiramente. A comida faz-me azia. Nem dos caramelos com pinhão gosto muito.Mas estava eu a passar a puente Saramago para Portugal e lembrei-me da “Jangada de Pedra” que não tinha ponte nenhuma para o resto da Europa, navegava isolada em pleno Atlântico.”Vejo a Ibéria como a criação de um país novo” ecoa a entrevista ao Expresso desta semana. Não sei se por amor, por insanidade, por vingança política ou por tardia convicção. Lutou à sua maneira pela liberdade, escreveu, escreveu, escreveu, nesse escrever criou novas regras de pontuação, deu-nos o Nobel, deu-nos com os pés quando trocou o sol de Lisboa pelas cinzas de Lanzarote, deu-nos a puente e, por causa dela, talvez se tenha esquecido de quem realmente somos.

4 comentários:

Fora de mão disse...

Espanha é um país fantástico. Só é mesmo pena estar cheia de espanhóis :-).
Quanto ao José, tacanho, retrógrado e mesquinhamente nacionalista como sou, começa a enjoar-me.
beijo

Urso Polar disse...

Por cá, em vez de se dar o nome do homem a uma ponte perseguiu-se pelos seus romances heréticos, pagãos.
Por muito que o tente evitar, Saramago é português, e isso vê-se no seu passado muitas vezes incoerente e nas suas declarações "esquecidas". Mas gosto de muito do que escreve, e acho bem que continue provocador, agitador, porque por cá também faz falta quem consiga, com seriedade, promover a Ibéria, quando Espanha luta com os regionalismos.

Nanny disse...

Acho que qualquer ser humano que comece a atingir a senilidade deveria ser proíbido de dizer certas coisas... acho que o homem está a ficar senil... sei lá!

Ibéricos sempre fomos... e seremos, enquanto não empurrarem esta tira comprimida para dentro do mar... agora espanhóis??? Irra!!! O meu ego não chega para isso, tinha de ir aprender tudo de novo :P

Beijoca

Ouriço-Cacheiro disse...

Esclarecimento: adoro o Saramago ficcional (o único que não gostei foi o Ensaio sobre a cegueira...argh!!!!!! O Memorial e O Ano da Morte de Ricardo Reis estão entre os meus livros favoritos), já o real...no me gusta lá mucho.